Em meio ao alvoroço das mudanças políticas, da posse do novo presidente e dos sentimentos que estão envoltos na virada do ano, me pego pensando no que queremos, no que vamos fazer e em nossas metas para 2023. Inevitavelmente as pautas pretas nos vem à cabeça e começamos a traçar o rumo de nossas vidas. E os desavisados vão me questionar: O que o novo presidente tem a ver conosco? O que a política tem a ver com metas para 2023? Então… deixa eu te contar uma história! Ao ver o resultado das urnas, já foi possível sentir a esperança de mudanças, de ver nossas demandas acolhidas pelo Governo Federal e poder ver marcos da história preta respeitados. Estamos diante de um governo que tem o maior número de ministras mulheres da história, em que o recorte raça e cor tem importância e que as calças da primeira dama são símbolo de resistência.
Ressaltando também o recado dado, quando vimos o cachorro do presidente subir a rampa do Palácio do Planalto: a causa animal é prioridade. Em um país em que as pessoas foram tão agredidas no período de pandemia, ver Silvio Almeida assumir o Ministério dos Direitos Humanos faz eu me sentir “valiosa” e lembrar que “existimos”, e que temos a possibilidade de deixar de sobreviver para poder crescer. No Ministério da Cultura, Margarete Oliveira vai imprimir esse olhar de mulher preta, que faz ponte entre a cultura e gestão com graciosidade. No tão esperado Ministério da Igualdade Racial figura Anielle Franco, educadora, ativista de pautas raciais, encabeça a missão de evoluir contra o preconceito racial.
Nós, povo preto de todo o País, temos a expectativa de reconstrução das políticas de reparação histórica tão sonhadas, de atenção à juventude preta e de reconhecimento que a pauta preta não pode ser um pequeno recorte, baseado no fato que 56% da população é negra. Marina Silva, no Ministério do Meio Ambiente, não vai deixar a “boiada passar’’, devido a sua dedicação ao patrimônio ambiental do Brasil, para corrigir erros significativos dos últimos anos. Chamo atenção para a ministra Sônia Guajajara, mesmo sendo contraditório pensar que, em 2023, ela será a primeira ministra dos povos indígenas.
Somente na atualidade os primeiros habitantes desta terra tenham papel de fala como ministros e representatividade de fato na elaboração de políticas públicas para o seu povo. Provavelmente a criação do Ministério dos Povos Indígenas seja uma das ações políticas mais decentes que poderemos acompanhar no curso da história contemporânea.
Não repetirei erros do passado ao invisibilizar a contribuição dos outros protagonistas desta história, por serem homens ou mulheres brancas. Mas lembro a todos os leitores que estes grupos já têm seus direitos adquiridos e gozam deles com a devida proteção, e a dita igualdade. Tenho ciência que ainda a maioria da equipe são homens, brancos, cis, de familias tradicionais, que não compartilham das mesmas demandas que muitos de nós, mas meu alento é pensar que em outros tempos eles seriam os únicos detentores do poder e hoje o poder está partilhado por outros saberes. Não somos ingênuos a ponto de pensar que tudo será resolvido, e muitos vão questionar a capacidade de mudança, possíveis rupturas, desistências e alta pressão. Fatos pertinentes ao processo, com possibilidades reais de acontecer, no entanto, vou me apegar à alegria do momento, vou festejar à vontade de mudar e vou ter esperança naquilo que vejo. Asé!