Imaginem a situação: A pessoa está com pressa, abre a porta da garagem, entra no carro, vira a chave e nada. Tenta mais uma vez, e outra, e outra, mas nem sinal de dar partida. Desembarca e abre o capô, porém sem muita noção do que olhar. Depois da superficial inspeção, volta para dentro de carro com a única certeza de que o motor ainda está lá. Bate a chave uma, duas; depois da quinta, desiste. Solta o freio de mão, empurra o carro para fora da garagem, encharca ele de álcool e taca-lhe fogo. – Problema resolvido – pensou o motorista. Será? Sei que não faz sentido. Por isso pedi para imaginarem.
Vendo a repercussão da tragédia de Brumadinho, lembrei-me de uma entrevista logo após a de Mariana. Alguém do governo disse que Minas Gerais não podia simplesmente virar as costas para a mineração, pois ela era uma das principais atividades econômicas do estado. Isso foi uma resposta à enxurrada de críticas ao setor, sendo que o que menos faltava era proposta de parada imediata das atividades mineradoras. No calor do momento, onde vidas foram perdidas e até um rio morreu, é compreensível a indignação. Não dava pra deixar por isso mesmo. A questão é “o quê” exatamente deve ser feito?
Fazendo uma comparação simplória com algo que aconteceu no nosso estado, vamos relembrar o caso do leite com soda. A cadeia do leite vai desde a vaca até o consumidor final. No meio desse caminho, um grupo de gananciosos fez coisas que colocaram a saúde dos consumidores em risco. Sendo assim, seria uma boa ideia terminar com a produção de leite no estado? Pensem bem; o produtor de leite não pode ser responsabilizado pelo crime do empresário que embala o leite. Se ele não é responsável, porque deve ser penalizado?
Isso pode ter uma explicação, ou várias. Tenho duas hipóteses: A primeira é sobre a facilidade que temos em propor mudanças onde não estamos envolvidos. Por exemplo, alguém que não consome leite tem mais facilidade para sugerir a extinção das vacas leiteiras, já que, pra ele, isso não faria falta. Já no caso das mineradoras, a menos que você se locomova com uma bicicleta de bambu e more no mato, fica difícil viver ser metal. A segunda tem ligação com o fim da cultura do conserto. Tudo parece feito para ser descartado. Não encontramos peças ou, quando sim, o concerto é mais caro que comprar novo. Daí surge uma geração que não sabe procurar a causa do problema. Joga-se o problema todo no lixo.
Não devemos por fogo no carro quando ele não funciona – mesmo tendo muita vontade -, nem sugerir isso a um conhecido quando o problema ocorrer com ele. Do mesmo modo, a solução para conter as tragédias na mineração passa pelas barragens de rejeitos. Assim como está, não funciona; não aguenta. Devíamos ter aprendido com Mariana. Que não passe de Brumadinho.