“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Este é o teor do artigo 227 da Constituição Federal, promulgada em 1988, disciplinado depois pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990. Embora já tenham se passado 30 anos, em muitas situações a lei não passa de letra morta frente o descaso das autoridades em todos os níveis com a infância e a juventude. Um exemplo temos aqui mesmo, diante dos nossos olhos, nas comunidades de Vendinha e do bairro Estação, onde menores são obrigados a enfrentar, a pé, rodovias movimentadas e o risco de assaltos e outros tipos de violência, todos os dias, para ter acesso à educação. A situação já dura mais de um mês e ainda não produziu nenhuma ação de protesto daqueles que foram eleitos para defender a sociedade contra o descaso e exigir o cumprimento das leis.
Omissão I – Em Vendinha, alguns alunos da Escola Estadual Adão Martini perderam o benefício porque moram a pouco menos de dois quilômetros da instituição, limite mínimo exigido pela lei. O problema é que, assim, eles são obrigados a caminhar nas margens da BR-386, cujo apelido, “Estrada da Morte”, deixa claro o risco a que estão expostos.
Omissão II – A outra situação envolve estudantes da Escola Promorar que residem no bairro Estação. Também neste caso, a instituição fica a um pouco menos de dois quilômetros de suas casas, mas, para chegar até lá, é preciso transitar pelo acostamento da ERS-124, não menos perigosa do que a Tabaí-Canoas. O agravante é que, entre os prejudicados, há alunos do programa Educação de Jovens e Adultos (EJA), cujas aulas são ministradas à noite. Agora imagine seu filho ou filha retornando da escola, no acostamento de uma rodovia, depois das 23h. É a crônica da tragédia anunciada.
Evasão – O receio dos estudantes é tão grande que, na Escola Promorar, a evasão já começou. O número de alunos do programa Educação de Jovens e Adultos está diminuindo, segundo a direção, por causa da falta do transporte escolar à noite. Muitos são jovens que trabalham o dia inteiro e não têm outra alternativa para concluir os estudos na busca por uma vida melhor e um futuro mais digno.
Máquina – Nos dois casos, a “culpa” parece ser de um software contratado pela secretaria estadual da Educação para fazer o gerenciamento do transporte escolar. A máquina simplesmente cortou todos aqueles que moram a menos de dois quilômetros da escola. E quem a formatou parece que simplesmente ignorou que distância não pode ser o único critério. A falta de “humanidade” do equipamento e daqueles que o operam está produzindo graves injustiças.
Absurdo – Na Vendinha, o quadro beira o absurdo. As vans pagas pelo contribuinte possuem espaço suficiente para transportar os estudantes que correm perigo na beira da estrada, mas não podem levá-los porque não estão na lista fornecida pelo Estado e usada como referência pela Prefeitura, que opera o serviço de transporte escolar.
Economia – Ainda que a responsabilidade pela indicação dos alunos das escolas estaduais que devem ser transportados seja da Seduc, quem gerencia todo o processo é o Município. Semana passada, em entrevista coletiva de prestação de contas dos seus seis meses de governo, o prefeito Carlos Eduardo Müller destacou a economia de R$ 120 mil por mês na prestação deste importante serviço. Colocando em risco a vida de crianças e adolescentes, será que vale a pena?
Mexam-se! – Apesar da importância do tema, até agora, não se viu uma mobilização, por exemplo, da Câmara de Vereadores, que possui até uma Comissão de Cidadania e Direitos Humanos para tratar de problemas desta ordem. Talvez esteja faltando um atropelamento ou o sequestro de uma criança para que suas excelências deixem de lado as disputas internas e cumpram seu dever. Mas aí será tarde demais.
Consciência – Quando falta dinheiro, os governos agem sempre da mesma forma: suprimem serviços, ao invés de fazerem cortes em suas pesadas estruturas de pessoal, onde centenas de políticos são acomodados por interesses partidários. A sociedade, que paga por atendimento de qualidade, é a grande penalizada. Os alunos prejudicados são de escolas estaduais, é verdade, mas são todos montenegrinos. Logo, se o Estado não cumpre o seu papel, cabe ao Município supri-lo. Se não quiserem arcar com o peso de uma tragédia na consciência, cuidem das nossas crianças!
Deu a louca na Câmara
Recapitulando: no dia 15 de março, a vereadora Josi Paz (PSB) e seu colega Felipe Kinn da Silva (PMDB) renunciaram aos cargos de secretária e vice-presidente da mesa diretora da Câmara. O motivo: o presidente Erico Velten (PDT) exonerou uma assessora especial indicada por Josi sem comunicá-la e nem dar explicações. Com isso, Velten ficou na obrigação de conseguir novos companheiros para se manter no cargo. Adivinhem quem topou assumir a vice-presidência? Valdeci Alves de Castro. Sim, um companheiro de legenda da vereadora Josi Paz.
Ilógica – Que a Política não é o império da lógica e do bom senso, todos sabem, mas situações como esta desafiam a compreensão. E também mostram que os partidos são meros instrumentos para o exercício do poder, sem unidade e linha de ação.
Faltam dois – E por falar nisso, assim que retornou de sua licença, Juarez da Silva, do PTB, também deixou a função de segundo secretário. Agora, para voltar a ter a mesa completa, Velten ainda precisa encontrar substitutos para ele e para Josi Paz. Quinta-feira tem nova tentativa.
Para além do descaso
Se as estradas do interior estão mesmo recebendo manutenção como o prefeito anunciou, é bom priorizar a que serve Linha Catarina e Lajeadinho. A situação é tão ruim que foi suspenso o transporte de estudantes e um pai está sendo obrigado a levar as filhas de trator para a escola. A palavra “descaso” já não é suficientemente forte para definir a relação entre a Prefeitura e algumas comunidades rurais.
Socorro – Sexta-feira, depois que o assunto foi capa do Jornal Ibiá, as máquinas da Prefeitura estiveram no local e fizeram melhorias. A qualidade do serviço, porém, ainda terá de ser testada. Pelo menos o transporte escolar deve ser restabelecido.
Botando pra correr
Em seu retorno temporário à Câmara de Vereadores, na quinta-feira, Renato Kranz (PTB) elogiou os bageenses que receberam Lula com vaias e protestos na semana passada. Ele espera que, se o ex-presidente um dia vier à cidade, os montenegrinos o coloquem para correr. Kranz definiu o líder petista como o “maior ladrão da história do país”.
Rapidinhas
* Vereador Felipe Kinn da Silva (PMDB) está propondo a implantação de uma diretoria de Políticas Públicas de Igualdade na Prefeitura. Calma, gente! Não se trata de um cargo novo, mas da adequação das atribuições de um que já existe.
* Renato Kranz pede que a Prefeitura institua gratificação a professores e funcionários que atuam em escolas consideradas “de difícil acesso”. Uma demanda antiga dos profissionais do setor, do tempo em que Kranz era secretário de Educação. Na época, não foi atendida.
* O vereador Valdeci Alves de Castro, do PSB, partido que integra a coligação vencedora das eleições de 2016, anda incomodado. Nas últimas semanas, tem feito pedidos de informações para saber por que as suas solicitações não são atendidas pelo prefeito. Talvez porque são muitas.