Cheiro de novo

Essa semana vi a notícia de que o comércio especializado em material escolar está, pelo Brasil afora, incerto a respeito das vendas deste ano. O motivo é justo: sem aulas presenciais, muita coisa ficou guardada. As mochilas então, essas nem sujaram as rodinhas. Mas é claro que muito terá de ser reposto e acredito que esse setor irá sim faturar, mesmo que abaixo dos anos anteriores. Primeiro, porque mesmo em casa as crianças desenharam e pintaram, gastando as canetinhas e os lápis de cor. O caderno sim, em tempos de aula on-line, poucas páginas foram preenchidas. Mas além das vendas por necessidade, há também neste segmento as que ocorrem por fazer brilhar os olhos – dos pais e das crianças.

Esta reportagem me fez lembrar o meu período de colégio. Como estudei nas escolas onde minha mãe lecionava ou já havia dado aulas no passado, meu material – e o uniforme – tinha de ser organizado e se manter em bom estado. Não tínhamos dinheiro para supérfluos, então, era tudo bem básico e, o que era possível, reaproveitado de um ano para outro. Eu sempre adorei a volta às aulas e não apenas pelo material novo ou pelo estudo. Criança um tanto solitária que fui, a oportunidade de rever os colegas sempre me alegrou. Mas é inegável que eu escrevia com mais capricho na primeira página do caderno. E a alegria de saber que, naquele ano, o livro recebido pelo Governo Estadual era novo, ainda no plástico, ainda está guardadinha nas minhas lembranças. Assim que chegava em casa eu encapava com todo o carinho os livros e cadernos.Que felicidade! Ver tudo bonito e arrumadinho me trazia vontade de estudar, de aprender e de me dedicar nos meses de aula.

Hoje não é exatamente assim. Com a tecnologia, as crianças mantêm contato com os amigos mesmo fisicamente distantes, então a volta não é necessariamente algo importante. Ou não seria, pelo menos. Depois de tudo que passamos em 2020, com muitas crianças fora da escola, é possível que, quando as aulas presenciais voltarem, este seja um período muito especial. Mas encapar caderno é uma atividade que não espero nenhuma criança desta década experimentar, afinal, não deixarão de mostrar os personagens que estampam – e encarecem – os materiais e fazem a alegria da turma. Apesar de um ano que ainda começará atípico, tenho esperança de que logo o ano letivo entre nos eixos. É necessário. Tanto quanto foi o fechamento das escolas em prevenção a Covid.

Minha preocupação agora está em vermos as crianças e adolescentes efetivamente recuperando o tempo perdido. Quem convive com elas sabe que por melhor que a escola seja, mais dedicados os professores ou esforçados os alunos, ficaram pendências para trás. Nossas crianças não foram desafiadas como deveriam e não aprenderam tudo o que poderiam. Elas têm capacidade para muito mais. Não quero o ensino normal. Com falta de professor e de condições de aprender. Quero ensino de verdade e com muito contato físico, para suprir o que foi tomado das crianças no último ano. É claro que nem todos os pais, devido a triste situação econômica que impera no país, poderão comprar material escolar ao gosto das crianças. Mas eu espero que todos tenham o mínimo necessário para aprender e para fazer brilhar os olhos. Estudar é ter esperança. É o que permite vislumbrar um futuro melhor. É sonhar. Estudar é o que cada criança merece. E é função de todos nós tornar este ato algo feliz.

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