A modernidade dos nossos avôs

Por vezes, ouvimos que a moda é cíclica, que a modernidade é líquida e que a sociedade se reinventa em si mesma. E parece que, cada vez mais, evoluímos para aquilo que já foi praticado há algumas décadas e, mais recentemente, vinha sendo considerado “coisa de velho” ou até mesmo vergonhoso.
O que vemos, diariamente, é a sociedade caminhando em direção a conceitos tão modernos quanto antigos, como o respeito à natureza, valorização da simplicidade e o tal do Do It Yourself (DIY) que, em português, significa nada mais do que “Faça Você Mesmo”. Ou seja, uma forma moderna de dizer “Põe a mão na massa”. Hoje é cool (moderno, descolado) alimentar-se de produtos orgânicos, reduzir a produção do lixo e buscar, na área profissional, a realização ao invés do enriquecimento a qualquer custo. Isso é muito legal. Temos aí nortes de vida bastante interessantes, mas que de novos não têm nada.
Lembro da minha avó colhendo seus legumes na própria horta, feita com fertilizante natural, como casca de frutas (olha aí a composteira, ensinada em vários vídeos de DIY no Youtube) e esterco de vacas. E isso muito antes de produtos orgânicos serem moda e custarem valores absurdos. Eles estavam ali, de graça, na natureza, a 10 passos da cozinha. Eles não eram veganos ou vegetarianos. Nunca passou pela cabeça dos meus avós deixarem de comer carne e eles até criticavam quem o fazia, pra falar a verdade. Mas o trato com seus bichos de estimação era sempre de muito respeito, do tipo “se não vai cuidar bem, nem tenha bicho”.
O leite, quando não era tirado da vaca ali no sítio mesmo, vinha em garrafas retornáveis e os resíduos orgânicos iam para um cantinho do quintal, para se decomporem. Quase não se produzia lixo. Uma camiseta velha virava pano de tirar pó; uma toalha muito usada, transformava-se em pano de chão e um pneu furado virava tiras de borracha que serviam para amarrar quase qualquer coisa. Quando se precisava de alguma coisa, se fazia em casa mesmo. De manteiga a reparos na casa e, quando eles iam comprar uma roupa ou utensílio, buscavam comparar preço e qualidade, a fim de adquirir aquilo que durasse mais tempo, evitando o desperdício.
Com o tempo, vi essas atitudes tornarem-se obsoletas, consideradas ultrapassadas e serem atropeladas pela modernidade líquida apontada pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman, que conceituava a contemporaneidade construída através dos pilares frágeis da insegurança e do consumo, ausente de referenciais morais e político.
E agora, como que num grande insight coletivo, a tecnologia evolui na direção daquilo que já era feito há 20, 30 anos. Jovens com roupas vintages (aquelas que nossos avós usavam mesmo – de boa qualidade, diga-se de passagem) evitam o consumo desenfreado com o discurso da valorização dos momentos em detrimento dos bens. É o famoso estilo minimalista, que está na moda e faz as pessoas evitarem tudo aquilo que não é realmente necessário. Coisa que minha avó chamava de compra inteligente.
Se há 10 anos nós enlouquecíamos com o boom das redes sociais e as facilitações proporcionadas pela internet, hoje o detox digital, mais do que um modismo, se faz necessário para que possamos viver o presente. Quem bom que estamos olhando para trás e encontrando modernidade naquilo que já foi considerado obsoleto. E isso não é uma crítica, mas uma feliz constatação de que evoluímos para um olhar cada vez mais voltado ao simples, ao que faz bem de verdade e à sensação de felicidade. Parafraseando Renato Russo, quem me dera que o mais simples fosse visto como mais importante. Espero que seja.

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