Nesses últimos dias o maior podcast do Brasil, e um dos maiores do mundo, foi destruído por cinco minutos de fala. Depois de construírem por anos sua reputação, sua base de fãs e seguidores, o Flow encontrou o fim de seu formato original por conta de uma opinião muito mal expressada. Tudo bem, sabe-se que um dos apresentadores, o Monark, sempre foi de falar pelos cotovelos, falando demais e falando bobagens, mas essa última não seria deixada de lado. Tudo bem, também, que logo o Flow retornou com apenas um apresentador e provavelmente o Monark planeja seguir com outro podcast; mas o Flow original acabou, assim, do nada.
A internet não perdoa. É como uma manada de bisões que, quando estoura, seguem os da frente sem avaliar muito por onde estão indo. Reflexões rasas, juízos rígidos e uma moral tão elevada que nem mesmo os Santos escapariam de sua punição. É incrível como o tribunal da internet consegue transformar a vida de uma pessoa da noite para o dia. Seja para o bem, seja para o mal.
O que o Monark falou foi ruim? Não, foi péssimo. A tentativa dele de defender um partido de direita equivalente à extrema esquerda foi barranco abaixo quando ele citou de exemplo o partido nazista. E daí em diante, toda a tentativa de defesa dele foi como uma pessoa que, atolada na areia movediça, ao invés de ficar quieto, começa a se debater. Porém, é óbvio que o cara não compactua com isso. Ele não é nazista nem é contra os judeus. Em um regime nazista ele já estaria preso há anos (ou pior); afinal, sua família, de sobrenome Aiub, originário de Bagladesh, não seria bem vinda no“terceiro reich”.
É fato que a liberdade de expressão termina onde começa a do outro, e onde começa a ameaçar a vida do outro. Mas o bom senso de entender que uma pessoa bêbada, falando bobagens por duas horas com “amigos”, vai falar besteira, cedo ou tarde. Tudo bem que não se faz isso ao vivo para milhares de pessoas, mas o bom senso deve persistir. E não estou aqui em defesa do Monark, não. Ele semeou uma coisa e agora precisa colhê-la. É a lei da vida.
O que quero deixar levantado aqui é: até onde uma pessoa pode errar para que a internet a guilhotine? Quais os níveis de importância que damos a certas coisas, para que a revolta extrapole todo o bom senso e nos tornemos bárbaros? A morte de mais de 6 milhões de Judeus no holocausto com certeza é algo para se ter como parâmetro para se revoltar; e, como descendente de família judia, concordo plenamente.
Então por que não fazemos o mesmo, por exemplo, quando um indígena é maltratado ou quando se fazem piadas com eles, sendo que a colonização matou mais de 56 milhões deles? O maior genocídio da humanidade se deu aqui, nas Américas, com nossos povos indígenas. E, ainda assim, não nos revoltamos na internet quando fazem graça ou caricaturam sua cultura riquíssima e bela. Por isso pergunto novamente, qual o grau de importância que damos as coisas? Até onde, e com quem, alguém pode errar ao ponto de ser decapitado digitalmente?
O fim de todas essas perguntas está em uma única palavra: hipocrisia. E devíamos nos enojar de nós mesmos ao participar disso; porque somos melhores que esse nível raso de julgamento, somos animais sociais e empáticos. Então… vamos ser mais humanos.