Na semana que antecedeu a morte do meu pai, eu aprendi com ele um segredo que passou a nortear minha busca pela verdade; meu aprendizado e minha evolução. Ele me passou uma chave que eu só fui entender décadas depois. E essa chave é minha guia desde então. E uma guia difícil. Ainda estou aprendendo a usá-la.
Essa chave, que compõe um segredo oculto tão profundo, é encontrada espalhada aos montes em diversos segmentos no mundo. Mas principalmente na literatura antiga. E, ainda que eu não tenha como revelá-la, não me é impedido de deixar algumas pistas sobre ela.
Certa vez eu conheci uma pessoa que dizia ter morrido várias vezes. E, isso, prá mim na época, pareceu um absurdo. Como alguém poderia morrer mais de uma vez? Mas hoje sei que é possível, porque não se trata de uma morte física, mas uma morte interna. Uma transmutação daquele ego que é ilusório. Que é composto das coisas que assimilamos do mundo, dos outros, dos vícios. E essa morte do ego nós precisamos buscá-la todos os dias. Mas não se trata também de um simples rejeitar dos desejos mundanos, das avarezas e coisas do tipo. Não. É um processo real de morte do ego, realizado através de um intrincado sistema de percepção interna. E, sempre que morre o ego, você morre e nasce de novo. E, claro, um novo ego nasce junto. Essa é uma batalha constante, mas valiosa; é constante porque enquanto seres humanos, somos suscetíveis ao ego, e valiosa porque quanto mais matarmos o ego, mais domínio sobre ele teremos. E é isso que se trata a evolução interna. Quanto mais vezes o ego vai morrendo, mais fraco é seu domínio sobre nossas vontades, assim, mais silenciosa das vozes caóticas do mundo nossa mente se torna. E, em silêncio, podemos ouvir outros sons, que são abafados pelo barulho do ego.
Foi quando entendi o que eram as “mortes” das quais aquela pessoa falava que percebi quando foi a minha primeira morte. E que eu mesmo já havia morrido algumas vezes.
A minha primeira morte foi talvez a mais impactante, porque um mundo novo se abriu para mim. A sensação de cessar os barulhos do mundo, de aquietar todos os sentidos ao ponto de não sentir e, mais que isso, ouvir somente de forma interna, é inexplicável. Não há como traduzir em palavras a sensação de “ouvir” uma única e profunda vibração que ecoa por tudo o que existe e, mais que isso, unir-se a ela e vibrar com ela, tal como nosso corpo vibra quando vocalizamos uma nota junto com um instrumento musical. A sensação de estar em todos os lugares ao mesmo tempo e, por mais paradoxal que possa parecer, ainda assim não estar em nenhum, é reconfortante de um jeito que nenhuma sensação pode replicar.
As partes que compõem o conjunto que identificamos como nosso “ser”, são repletas de sujeira, vícios e impurezas. Porém essa é a casca que é composta das coisas do mundo, coisas que nos são impostas e ensinadas, que absorvemos e copiamos. Não se tratam do que realmente somos. E a Grande Obra, por assim dizer, é o trabalho de desbastar essas impurezas até que, o que sobra, é o que realmente somos. E esse é um trabalho puramente interno.
É destruindo essas ilusões externas, do que achamos que somos, matando nosso ego, morrendo com ele, que poderemos renascer cada vez mais próximos daquilo que realmente somos e, assim, ouvir os sons que são verdadeiros e que nos chamam em direção à perfeição. Por isso dedique-se, aquiete-se e evolua. É disso que se trata ser verdadeiramente humano.