Quem, por ventura, consegue a rara façanha de mergulhar no mais profundo Silêncio, percebe que, além daquele aparente vazio de som, existe, de fato, um zunido que ressoa suave e incansável por toda a existência. E aquele que, tendo conquistado esse fantástico feito de uma vida inteira, entoa essa mesma nota primordial, percebe seu ser vibrar como um instrumento musical em harmonia, conectando-se com Aquele que está além da compreensão da mente, seja ela humana ou animal. Essa conexão rompe por algum tempo as paredes mais pesadas e fortificadas da consciência do ser humano e permite a ele um vislumbre das possibilidades dadas aqueles que sabem como pronunciar o impronunciável.
Sei que, a princípio, o texto acima pode parecer muito maluco, mas ele quer dizer que somente pode-se expressar Deus pelo Silêncio, visto que não se pode compreendê-Lo, nem percebê-Lo em sua plenitude. Não que Ele esteja além do alcance do ser humano, pois estão sempre juntos, mas porque esse mesmo ser humano, cego e surdo, é incapaz de absorver Sua presença. É impensável, incompreensível a forma como Deus existe, cabendo às pessoas comuns apenas admirá-Lo através de Sua criação.
Entretanto, aquele que consegue ver por entre as fendas das muralhas que cegam e ensurdecem a mente, percebe o quanto Deus lhe revela, sussurra-lhe e guia-lhe por entre os caminhos da vida. Mas aqueles que nunca golpearam a parede, que nunca lhe trincaram uma fresta, vivem um vazio triste, sem sentido, porque o caos do mundo é a única coisa que conhecem e percebem. Mas esse não é o motivo de ser da humanidade que existe para ser plena e feliz. Para trazer luz ao mundo.
Nesse sentido é imperativo ao ser humano silenciar sua mente animal, exaltar a mente humana, para que se possa, passo a passo, abrir e espiar por entre as frestas de onde a Luz primordial de Deus chega e preenche, revelando-lhe os mais sublimes influxos que lhe guiarão em harmonia através a vida.
Sabe-se de um homem, que há poucos anos sentou-se confortável no chão de seu quarto, de olhos fechados, e, ouvindo som por som, como se fossem instrumentos solos, separados, tocando cada um sua nota, juntou-os em uma sinfonia caótica para, em seguida, silenciá-los, um a um, até que somente o Silêncio fosse sua companhia. Nesse momento, uma vibração trespassou seu corpo, ressoando como um único e primordial instrumento, reverberando por todo o seu ser uma única nota. E aquela nota sublime, além da compreensão, que preenche toda a existência, ainda hoje está gravada em sua memória e deu a ele uma chave que abriu uma porta que jamais poderá ser fechada, se não por ele mesmo, cuja chave possui.
Esse Deus oculto que somente o Silêncio pode expressar e que se manifesta através de sua obra, ressoando sua nota primordial, vive através de cada ser humano, cada consciência viva e cheia de sonhos. E, dessa forma, é somente através Dele que o ser humano pode se realizar plenamente. Por isso, vire-se para o muro, silencie sua mente, e derrube a parede.