Reclamar demais pode ser uma doença

No Inverno reclama do frio. No Verão, considera o sol e o calor intensos demais. O trânsito – e aqueles que trafegam por ele – é, todo dia, alvo de xingamentos. As redes sociais se tornam um grande mural dos problemas do mundo. E, no trabalho, qualquer intervalo nas obrigações é oportunidade para falar mal de algo. Você conhece alguém assim? Em geral, todos têm um familiar ou colega “reclamão”, o “chato” do grupo e que costuma ser evitado tanto quanto possível. Saiba que reclamar pode ser uma doença e há como mudar esse hábito que, além de muito desagradável, costuma isolar quem o pratica.

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Tamara Santos de Souza, psicóloga
Foto: Arquivo pessoal

Conversamos com a psicóloga Tamara Santos de Souza para explicar esse comportamento que apesar de incomodar bastante quem está por perto, nem sempre é percebida por aqueles que sofrem do problema. A reclamação é um desabafo, uma forma de demonstrar que algo não vai bem. A origem pode estar em muitas causas, inclusive na forma de criação. Há aqueles pais que tanto cobram e esquecem de elogiar os avanços da criança, formando indivíduos extremamente críticos a si mesmo e aos demais. Mas quando é um exagero? A resposta não é exata. Sabe-se que há um problema quando esse hábito causa um sofrimento, um desconforto para si e a quem está à volta.

Tamara lembra que o ato de reclamar é natural do ser humano, mas que, em alguns casos, é um problema que vai além, chamado “distimia” e também conhecido como “depressão persistente”, quando se trata de um quadro mais leve, porém crônico, que se mantém por dois anos no mínimo. “Em alguns casos trata-se de pessoas mais inflexíveis, que se incomodam mais com determinadas coisas no dia a dia. Todos passam também por dificuldades na vida. Momentos difíceis, que geram reclamações. Em outros uma doença chamada distimia”, destaca a psicóloga.

Trata-se de um problema que tente a tornar a pessoa mais solitária. “As pessoas se afastam de alguém que só reclama de tudo. E se essa pessoa já está depressiva ela tende a piorar tornando-se mais sozinha”, complementa. Em geral, as pessoas só admitem se tratar de um problema e buscam por ajuda quando se trata de um transtorno mental que já gerou diversas dificuldades.

A saída possivelmente está na observação que cada um faz de si mesmo. “Se eu me observo muito estressado, nervoso, reclamando muito. Se eu percebo que estou agindo de uma forma diferente, talvez deva procurar ajuda”, incentiva Tamara Santos de Souza. Ao perceber que algo está errado é necessário questionar-se sobre as possíveis mudanças. “O que eu posso fazer para melhorar isso? Questionar as ações possíveis, além de apenas se queixar”, detalha a especialista. Muitas vezes a mudança não depende apenas de uma ação do outro, mas sim de mudanças de rumo na vida ou de atitudes que dependem da própria pessoa.

Guardar queixas também é perigoso
Se passar o tempo todo, nos 365 dias do ano, reclamando é chato e desagradável, o oposto também pode ser perigoso. A psicóloga destaca que as pessoas devem ser sinceras consigo mesmas. Tentar ignorar o que está sentindo, o que lhe incomoda, não auxilia em nada. Mas se reclamar é ruim e guardar as queixas também, o que fazer? Tentar resolver a questão é sempre a melhor escolha. “Se algo está incomodando, converse com quem está envolvido nisso. Sem ofender ninguém, é claro. Mas guardar as mágoas para si é prejudicial também. Vai acumulando, não resolve o problema e prejudica”, completa Tamara. O outro extremo do “reclamão”, aquele que se priva de falar o que lhe incomoda e finge estar tudo bem acumula para si as reclamações não feitas e nunca desabafa.

É salutar compreender que os comportamentos não nascem com as pessoas e seguem semelhantes por toda a vida. Sempre é possível mudar. E querer mudar é importante. Porém, depende de olhar para si mesmo, analisar-se e ver a necessidade da mudança. Na psicoterapia há formas para isso. Mas, muitas vezes, a pessoa chegará ao psicólogo por problemas indiretos. “A gente não tem as respostas nem estamos ali para julgar ou mudar ninguém. Até porque não adianta impor nada. Essa percepção de que algo pode ser melhorado virá como uma consequência”, diz Tamara de Souza.

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As reclamações exageradas podem ter relação com a distimia, um transtorno definido como uma tristeza que ocorre durante pelo menos dois anos, juntamente com outros sintomas da depressão
Foto: Reprodução internet

Tente auxiliar e não apenas se afastar
O comportamento natural do ser humano é afastar-se do que lhe faz mal, do que lhe incomoda. No caso dos “reclamões”, porém, isso apenas prejudica. A dica é: se você tem intimidade o bastante, fale, converse, dê sinais de que aquela situação incomoda aos outros. Isso para que a pessoa se dê conta que tantas queixas afetam aos outros. “Claro que às vezes é algo pontual. A pessoa está com algum problema seja em casa ou no trabalho e acaba desabafando. Mas isso são situações momentâneas. Se é algo contínuo e você tem proximidade o bastante, é melhor conversar com a pessoa ao invés de deixá-la isolada”, diz Tamara.

Escolhas profissionais podem influenciar
Não é raro alguém citar o “colega que reclama de tudo”. Nesse caso, além de um hábito, as reclamações podem representar uma insatisfação profissional. Não apenas financeira, mas também de satisfação pessoal. Ao não se sentir valorizado como merecido, ao invés de buscar por alternativas, o profissional reclama da situação. “Depende de cada situação, mas eu penso que as escolhas profissionais podem influenciar”, destaca a psicóloga.

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