A precariedade no saneamento básico ainda é um problema expressivo em Montenegro, razão de muitas queixas de moradores que convivem com esgoto a céu aberto em várias ruas. Agora, imagine morar em uma casa sem um sanitário que tenha água e esgoto canalizado. Visualize uma casinha de madeira no quintal, com uma espécie de cubo para substituir o vaso.
E o que fazer quando o recipiente ficava cheio? Aí entram os cubeiros na história de Montenegro. E o aniversário de 144 anos da cidade é uma boa oportunidade para lembrar um pouco do passado da cidade e de sua evolução. Eles eram funcionários da Prefeitura que recolhiam esses recipientes de madeira, chamadas de cubos, das residências, nas latrinas. Uma profissão que deixou de existir com as transformações do saneamento básico.
Em Montenegro, a coleta dos cubos era feita inicialmente em carroças. Com o crescimento da cidade, aumentaram os empregados envolvidos e o número de dias da coleta dos cubos. A partir de 1924, o recolhimento passou a ser feito com caminhões. Ao lado de um cubo doado por sua família ao acervo do Museu Histórico Municipal Nice Antonieta Schüler, a servidora pública aposentada, Susane Ferreira, 61 anos, lembra essa época. “Até os meus seis anos ainda havia os cubeiros”, recorda.
Ela observa os transtornos gerados pelo sistema, pois as carroças e caminhões que transportavam os cubos passavam pelas ruas da cidade e não havia como não sentir o mau-cheiro. O recolhimento era uma vez por semana. “Cabe ressaltar um pouco da história, quando os banheiros das casas eram lugar para se tomar banho”, observa. “As necessidades eram feitas em lugar próprio, no pátio das casas, em umas casinhas chamadas latrinas”, acrescenta.
Por isso, observa Susane, havia a necessidade dos cubeiros e de um local da Prefeitura apropriado para o depósito. O conteúdo dos recipientes era depositado na “Chácara de Montenegro”, onde hoje se localiza o bairro Municipal. Sua limpeza era feita com desinfetante, em pequenas lagoas ou córregos. Esse sistema precário foi utilizado até 31 de dezembro de 1961.
Embora o uso de latrinas praticamente deixasse de existir com a canalização de água, assim como a profissão de cubeiros, há pontos comuns entre esse passado distante e o presente. O trajeto feito pelos dejetos hoje é diferente, canalizado por baixo da terra, longe dos olhos dos cidadãos, mas a falta de tratamento de esgoto continua e é a principal causa de poluição do Rio Caí.
Controle sanitário
“Atendendo solicitação do senhor médico chefe, visitei a residência do senhor …. à rua…. nesta cidade, não tendo encontrado em seu pátio qualquer vestígio de criação de abelhas, o que torna sem procedência a reclamação feita pelo senhor …., a esta entidade.”
Escrito com caneta azul, em um papel amarelado pelo tempo, o texto é assinado pelo então técnico de inspeção sanitária Juvêncio Mendes Ferreira, e guardado pela sua filha, a servidora pública aposentada, Susane Ferreira. A data é do dia 7 de janeiro de 1978 e, para preservar as pessoas, omitimos os nomes e endereços.
Susane recorda que, devido à profissão do pai, que trabalhava para a Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde, percebia os problemas e queixas na área. Suas lembranças incluem reclamações sobre produtos comercializados em condições inadequadas ao consumo, bem como a falta de higiene nos estabelecimentos do comércio e principalmente da presença de insetos nos terrenos das casas devido à criação de porcos, galinhas e ao uso de latrinas. Neste contexto, ela lembra a existência do cubo no acervo do Museu Histórico, que pode ser visitado por quem tiver curiosidade sobre o assunto. Susane observa que, embora os recipientes fossem levados a um lugar específico, a existência de insetos e do mau-cheiro era comum, principalmente no trajeto até ao local de despejo.
Susane acrescenta que o Centro de Saúde concentrava todas as ações na cidade, tanto no que se refere à inspeção sanitária, como no atendimento médico, odontológico e vacinação. Ela lembra que inicialmente o local era instalado na rua Ramiro Barcelos, próximo a rua José Luiz. Depois mudou para a rua Capitão Cruz próximo a rua São João e, mais tarde, para a José Luiz. “A equipe de trabalho era muito unida, frequentemente se reuniam e realizavam festas na casa dos funcionários”, recorda. Seu pai costumava usar veículo próprio para o deslocamento nas fiscalizações. “Até hoje é lembrado como o ‘Fiscal da Lambreta’”, afirma.