Inclusão é fundamental para a formação social do estudante. O que ainda preocupa é falta de estrutura e profissionais especializados para atender a demanda
Dados coletados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), mostram que atualmente existem 750.983 estudantes com algum tipo de deficiência convivendo com os demais alunos nas escolas de todo o Brasil. O número é 6,5 vezes maior que o apurado em 2005. Esses resultados são reflexos de uma maior conscientização da população sobre o assunto, aliada às políticas públicas dos últimos anos. Mas ainda é o começo de um longo caminho a ser percorrido.
Antes mesmo de chegar à escola, alunos montenegrinos que precisam fazer uso de cadeiras de rodas, por exemplo, precisam se deslocar no asfalto, em virtude das más condições das calçadas. Já no educandário, o estudante precisa de acompanhamento especial, que garanta o seu desenvolvimento de forma igualitária.
Já com os colegas, o clima é de amizade e acolhimento, quase sem preconceito (há poucas excessões). Professores destacam ainda que os alunos com alguma deficiência não encontram dificuldades na aprendizagem e, assim como todos, desenvolvem mais facilidade em algumas matérias e menos a outras. A diferença é o auxilio de um plano de aula específíco, elaborado por monitores.
De acordo com coordenadora Helenise Avila Juchem, da 2ª Coordenadoria Regional de Educação (2ª CRE), de São Leopoldo, há 224 alunos, com alguma deficiência matriculados no Vale do Caí. No Estado, o número total é de 24.002 alunos atendidos. “É oferecido, a todos os alunos da educação especial, atendimento Educacional Especializado no contra turno, de um a dois encontros semanais, de acordo com a necessidade de cada aluno”, garante.
Atualmente a 2ª CRE conta com 61 salas de recursos autorizadas. O atendimento educacional especializado (AEE) refere-se à oferta de atividades diferentes das do currículo do ensino comum, tais como o ensino de Língua Brasileira de Sinais (Libras), Língua Portuguesa na modalidade escrita para alunos surdos; Sistema Braille, Orientação e Modalidade, Soraban (instrumento usado para o ensino da matemática básica, composto de diversas colunas, cada uma representando uma unidade, dezena, centena, etc.), ajudas técnicas, Comunicação Alternativa e Aumentativa, Tecnologia Assistiva, enriquecimento curricular, atividades cognitivas para o desenvolvimento dos processos intelectuais, entre outras.
Outro fator que contribui para esse aumento foi a Lei Brasileira da Pessoa com Deficiência (ou Estatuto da Pessoa com Deficiência), aprovada em 2015. A lei tem como objetivo assegurar e promover, em condições iguais, o exercício dos direitos e liberdades da pessoa com deficiência, visando essa inclusão social e cidadã. Por isso, ela proíbe a cobrança de valores adicionais nas matrículas e mensalidades por parte das escolas particulares em casos de alunos com deficiência.
Apesar das boas notícias, existem dificuldades na inclusão efetiva nas escolas, como a falta de capacitação por parte do corpo docente, que muitas vezes não está preparado para receber pessoas com algum tipo de deficiência. Outro fator relevante é o conhecimento sobre as características de doenças ou problemas fisícos, que dificulta a integração dos alunos inclusos com os demais estudantes.
Apesar do aumento no número de matrículas de pessoas com deficiências em escolas de todo o país, o levantamento aponta que apenas 26% das escolas públicas são acessíveis, nas escolas particulares esse número sobe um pouco mais, 35%. O aumento é significativo, já que em 2011 ele era de 11%, com tendência a melhorar.
Existem desafios para estudar? Segundo eles, só um pouco
Para a jovem Thaís Marques, de 17 anos, que está no 2º ano do ensino médio, o uso da cadeira de rodas não impede o bom desempenho em sala de aula, muito menos a convivência com os demais estudantes. “É tudo normal, tirando a Educação Física, claro. Mas todos me tratam muito bem e como sempre gostei de estudar não tenho tantas dificuldades”, revela.
Entre os sonhos da garota, está o de se casar. Mas, por enquanto, a prioridade é para os estudos e ela já escolheu até mesmo a área em que pretende atuar. “Quero cursar Psicologia. Acho que assim vou poder ajudar as pessoas e oferecer algo de bom para elas”, diz.
Durante o dia, Thaís faz muita coisa sem o auxilio de ninguém. Exemplo dessa independência é ir e voltar a escola sozinha. “É algo que às vezes as pessoas não entendem, a gente consegue fazer as coisas e minha mãe compreendeu isso e sempre deixou com que eu experimentasse a liberdade. Tenho limitações, mas tem coisas que dá para fazer sozinha e eu não abro mão disso”, diz.
O único problema é que Thaís, bem como outros cadeirantes da cidade, tem dificuldade para circular pelas ruas. Ela mora e estuda no Centro e, mesmo nesse ponto, precisa dividir espaço com os carros, devido as más condições das calçadas.
O estudante do 1º ano do Ensino Médio, Eric Amador de Souza, de 18, foi diagnosticado com a Síndrome de Williams. A síndrome se caracteriza por uma desordem genética do cromossomo 7, resultando em nariz pequeno e empinado, lábios cheios, dentes pequenos e sorriso freqüente. Uma das características de quem tem essa síndrome é a facilidade de comunicação e relacionamento. “Eu gosto muito de estudar e aprendo rápido. Mas o que eu mais gosto mesmo é de desenhar e pretendo ser pintor um dia”, diz. Ele conta que desde criança sempre gostou de rabiscar e logo aprendeu a desenhar carros e motos, os seus preferidos até hoje.
Jéssica Maria de Souza, de 18, também no 1º ano do ensino médio, gosta muito de estudar e se sente realizada em na escola, opinando que em casa não seria tão divertido. A garota tem deficiência intelectual leve, mas supera qualquer barreira ao abrir um livro. “Gosto muito de ler, sempre. Acabo um livro e começo outros. E meus preferidos são aqueles que contam a história do país ou de algum determinado fato”, conta. Todo conhecimento adquirido agora, certamente auxiliará em seu futuro curso de ensino superior, o qual ela também já decidiu: pretende estudar Direito.
Atendimento especializado para PCDs em Montenegro
De acordo com a secretária de Educação, Rita Carneiro Fleck, na rede municipal de ensino estão matriculados 80 alunos com deficiência intelectual, transtorno desintegrativo da Infância, baixa visão, deficiência física, deficiência auditiva e/ou surdez, Transtorno do Espectro Autista e deficiências múltiplas.
Ela afirma que a educação inclusiva tem como princípio fundamental o aprendizado coletivo, independente das diferenças ou dificuldades dos alunos. “Cada criança aprende de uma forma e toda forma e deve ser respeitada e valorizada. Todos aprendemos com as diferenças e nos tornamos seres humanos melhores”, comenta.
A respeito das finanças, o Governo Federal faz um repasse às salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE) a cada quatro anos. Rita garante que há uma boa estrutura nas escolas da rede municipal. “Dez escolas possuem Salas de AEE, que atendem no contraturno. O atendimento educacional especializado (AEE) é um serviço da educação especial que identifica, elabora, e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade, que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas”.
O professor que atua nesta área possui formação em Pedagogia e conhecimentos específicos de Educação Especial, adquiridos em cursos de aperfeiçoamento e especialização. A Smec oferta, aos alunos, atendimento Psicológico, Psicopedagógico e Pedagógico/Laboratório de Aprendizagem, que são encaminhados através de laudos médicos e/ou pelas escolas.
Os alunos que possuem laudo médico com alguma deficiência e/ou transtorno contam com o auxílio de monitor em sala de aula e atualmente 70 alunos possuem monitoria na rede municipal de ensino. A respeito das atividades extras, Rita afirma que são proporcionados, pela mantenedora, cursos, grupo de estudos, oficinas e palestras, ao longo do ano letivo.
Há também a formação aos professores, voltada à diversidade e que contempla conhecimentos sobre as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais, não só para os profissionais da educação, mas também aos monitores que atuam na Educação Inclusiva.
Outro serviço existente é a Associação dos Deficientes Físicos e Ostomizados, o qual é coordenado pela mãe de Thaís. Cintia garante que atualmente cerca de 120 pessoas participam do grupo, que serve para opinar mudanças estruturais que deveriam ser realizadas no município. “Depois a gente encaminha as solicitações para a Câmara de Vereadores, solicitando as melhorias. Quando o problema é em algum estabelecimento, é mais complicado, mas tentamos conversar com o proprietário para sugerir mudanças”, explica.
O grupo costuma se reunir uma vez por mês na Estação da Cultura. Cada encontro tem, em média, 15 participantes, devido aos compromissos diários dos participantes.
Família aprova inclusão
Os pais de Thais, Cintia Azeredo, de 45, e Airton Marques, de 57, sentem confiança quanto à convivência dela na sociedade. A mãe destaca que sem a inclusão é impossível exigir, de quem possui alguma deficiência, uma rotina normal, tanto estudantil quanto trabalhista.
“É fascinante ver ela como está agora, muito independente. Ela vai para escola sozinha, vai fazer compras, é uma adolescente como qualquer outra, mesmo precisando da cadeira de rodas. Estudar em uma escola, proporciona essa vivência e uma troca de experiências com outras pessoas da mesma idade que ela”, avalia Cíntia.
A dificuldade de Thaís é de nascença, quando ela sofreu com mielomeningocele, que é um defeito congênito em que a medula espinhal de um bebê em desenvolvimento não se desenvolve adequadamente. “Com isso ela perdeu a reflexão das pernas”, explica Cintia. A tia de Thaís, Rosangela Borges, de 54, lembra ainda que mesmo com a deficiência, a menina sempre gostou de aprender coisas novas e, principalmente, na parte da tecnologia. “A doença só impede ela de caminhar”, completa.
Monitoramento é essencial
A especialização dos profissionais que atuam com pessoas com deficiência é imprescindível. Quem afirma isso categoricamente é a monitora Gilda Flores Barbosa, de 45, que atende três alunas na escola São João Batista (uma delas é a Thaís). “Me especializei há seis anos porque senti essa falta nas escolas e realmente a gente vê o número de alunos aumentando, com a inclusão, mas o número de professores com especialização ainda é pequeno”.
A professora de Português e Espanhol Kele Adriane de Moraes, 34, também decidiu se especializar em 2013, e fica contente com a inclusão. Ela afirma que a escola é um dos melhores ambientes para a socialização e privar isso pode resultar negativamente no futuro. “O aumento significa uma evolução na educação”.
A educadora Simone Beatris da Rosa, de 30, sempre gostou de ensinar as formulas da Matemática e da Física, mas há cinco anos sentiu a necessidade de acrescentar a Educação Especial no currículo. Ela ressalta a importância do convívio inclusivo. “A inclusão abre espaço para esse público que precisa de mais atenção, mas é incrível como outros alunos também ganham com essa vivência. A experiência do dia a dia conta para toda a turma e o rendimento não diminui em nada”.
Desde 2012, Rochele Marques, de 39, se dedica a educação especial e coordena a sala de recursos da escola AJ Rener. Ela conta que o atendimento especial, de cerca de uma hora, faz toda a diferença paraalunos com deficiência. “É um momento de descontração e aprendizagem, com jogos e um atendimento particular. É maravilhoso”, define. Para participar, basta se dirigir a escola com um documento que comprove a deficiência do estudante.
Escolas que possuem Atendimento Educacional Especializado:
*EMEF Dr. Walter Belian- Sala AEE
*EMEF José Pedro Steigleder – Sala AEE
*EMEF Cinco de Maio – Sala AEE
*EMEF Etelvino de Araújo Cruz – Sala AEE
*EMEF São Paulo- Sala AEE
*EMEF Pedro João Müller – Sala AEE
*EMEI Gente Miúda- Sala AEE
*EMEF Adolfo Schüler- Laboratório de Aprendizagem
*EMEI José Flores Cruz- Sala AEE
*EMEF Esperança- Sala AEE