“Má fé”. Consumidores não teriam sido orientados em relação à necessidade de documento
A compra de veículos ciclomotores já gerou dores de cabeça para, pelo menos, quatro pessoas em Montenegro nas últimas semanas. Os consumidores adquiriram as motocicletas nas Lojas Lebes, acreditando não ser preciso ter documentação para conduzí-las, quando, na verdade, além da necessidade da Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) é preciso também fazer o emplacamento. As queixas não param de chegar ao Procon Municipal e a loja já foi notificada para se manifestar em até dez dias. Os consumidores querem o ressarcimento pelos gastos extras que tiveram em função das taxas de emplacamento e obtenção da Autorização para guiar.
Desempregada, Sandra Adriana Azevedo Venâncio, de 43 anos, investiu o valor da rescisão de seu último emprego na compra de um ciclomotor. Cansada de tentar habilitação na categoria A, para conduzir motocicletas, após três tentativas frustradas, ela achou que a “motinho” iria resolver seus problemas. “Fui na loja várias vezes pra esclarecer minhas dúvidas. Tinha um cartaz nela que dizia que a oferta era imperdível. Mesmo assim, eu perguntei várias vezes, inclusive para o gerente, se realmente não precisa ter habilitação para dirigir e ele confirmou que não precisava”, conta Sandra. Habilitação, propriamente dita, não é necessário, mas os consumidores deveriam ter sido advertidos de que precisariam ter o documento da categoria ACC.
Outra informação que foi negada aos clientes diz respeito ao emplacamento. “Eu só comprei porque achei que poderia andar sem ter habilitação e que não precisaria emplacar. Investi todo meu dinheirinho naquela porcaria”, exclama Sandra. Com a saída do trabalho, ela pretendia usar o ciclomotor para se deslocar pela cidade ao realizar faxinas. “Dei R$ 4.509,00 de entrada e parcelei o resto em nove vezes. Eu choro muito quando penso nisso”.
Sandra só ficou sabendo que não poderia usar o veículo porque o marido dela soube, por terceiros, que a Brigada Militar havia recolhido ciclomotores de pessoas na mesma condição que ela, ou seja, sem emplacamento e autorização para conduzir. “Só pude usar por duas semanas, agora ela está parada”, sublinha. O emplacamento já foi providenciado. Somando todas as taxas e o valor da placa, Sandra gastou em torno de R$500,00.
Contudo, a maior preocupação dela é em relação a ter que se submeter a todos os testes necessários para obter a ACC. “Eu fico muito nervosa ao fazer os testes. Queria essa moto justamente para parar de passar pelo constrangimento de ser reprovada”, desabafa. Além da questão emocional, ela destaca que trata-se de mais um gasto fora do orçamento, que gira em torno de R$ 1.000,00.
O que diz o Procon Municipal baseado no CDC
O Procon está realizando investigações preliminares referentes às reclamações recebidas por quatro clientes que adquiriram ciclomotores na Loja Lebes da rua João Pessoa, Centro de Montenegro. Em relação a duas denúncias, o estabelecimento já foi notificado e possui o prazo de dez dias, a contar a partir de 28 de junho, para se manifestar.
Segundo o secretário executivo do órgão, Fábio Júnior Barbosa, houve problemas em relação à oferta do produto. Isso fica claro por meio dos relatos encaminhados ao Procon pelos consumidores. “Os textos dos reclamantes se assemelham”, aponta Fábio.
A venda de três dos quatro ciclomotores foi realizada pelo mesmo atendente. Contudo, a responsabilidade pela negligência nas informações prestadas aos clientes, no momento em que não foi informada a necessidade do emplacamento e da autorização para dirigir, é da empresa. Vários artigos do Código de Defesa do Consumidor tipificam as falhas ocorridas nas negociações. Um deles trata sobre quebra da confiança entre vendedor e consumidor. “Foi má fé dos vendedores no objetivo de vender”, comenta Fábio. A falta de informação dos vendedores contrasta com duas situações observadas pelo Procon. Uma delas refere-se a um cartaz afixado na loja, no qual o cliente era orientado sobre as exigências. No site do fabricante do veículo, também há detalhes sobre a documentação.
O Procon pediu à loja a correção da oferta, que foi difundida, inclusive, nas redes sociais chamando os consumidores a adquirir um produto “imperdível”, que dispensava habilitação. O órgão também quer um relatório de quantos veículos foram vendidos desde o início do ano até 28 de junho. O Procon aguarda o posicionamento da loja para saber se haverá um breve desfecho para os casos, com ressarcimento aos clientes pelos valores extras, ou devolução do produto. Caso não seja apresentada uma solução justa, a situação será encaminhada ao Ministério Público. Até o fechamento desta matéria, a loja não se manifestou sobre os casos.
Como obter a Autorização para Conduzir Ciclomotores
O processo para solicitar a Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) é semelhante ao da obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O documento é exigido para a condução de veículos com até 50 cilindradas de potência.
O interessado deve ir até um Centro de Formação de Condutores (CFC) e solicitar a abertura do processo para obter a autorização. O cidadão vai passar por avaliação psicológica, exame de aptidão física e mental, além de realizar curso teórico e prático, com carga horária de 20 horas/aula. Está prevista, ainda, uma prova teórica, com 15 questões, das quais o candidato deve acertar 60%. Posteriormente, caso aprovado, dá-se início à parte prática de direção veicular, com carga horária mínima de 10 horas /aula. Nessa etapa, o candidato deve usar seu próprio veículo. Os CFCs não são obrigados a oferecer a motocicleta para aulas.
Por último, é realizado o exame prático de direção veicular, nos mesmos moldes para a obtenção da categoria A. Contudo, é importante ressaltar, a ACC não tem o mesmo valor da categoria A. Caso o condutor queira, posteriormente, inserir categorias como A ou B terá de abrir serviço de habilitação complementar e passar por todo o processo padrão aplicado para obtenção da primeira habilitação, ou seja, sem que haja aproveitamento das aulas realizadas para a ACC. Já o condutor portador da CNH categoria A pode circular em ciclomotores.
Em Montenegro, apenas o CFC Vida Segura oferece a ACC. A diretora do centro de formação, Vanessa Bozzetto, destaca a importância do treinamento adequado dos novos condutores. Mesmo para conduzir veículos de menor potência, é preciso estar preparado para cuidar de si e dos outros. “Somos responsáveis por quem está andando nas ruas. O trânsito existe a partir das pessoas que estão nas vias, temos responsabilidade e preocupação com elas. É fundamental que tenham conhecimento sobre a legislação e direção defensiva”, avalia Vanessa.
O prazo para conclusão do processo de formação é de 12 meses. Informações sobre valores devem ser buscadas junto ao CFC. Em setembro, devem ocorrer mudanças nos preços. Em relação ao emplacamento, o processo deve ser encaminhado no Centro de Registro de Veículos Automotores (CRVA).
Ciclomotores que não estiverem emplacados ou forem conduzidos por pessoas menores de 18 anos e sem a autorização podem ser recolhidos pela Brigada Militar. Já aqueles que estão dentro das regras devem ter atenção ao fato de que é proibido circular pelas rodovias.