Estratégia de interiorização. Uma família de refugiados já está na cidade e mais duas são esperadas
Como solução para a crise de refugiados na fronteira entre o Brasil e a Venezuela, o Ministério da Cidadania, as Forças Armadas e a Organização das Nações Unidas (ONU), com apoio de entidades da sociedade civil, promovem, há mais de um ano, o processo de transferência de imigrantes venezuelanos de Roraima para outras regiões do Brasil. Desde então, mais de 5,4 mil pessoas foram interiorizadas, e mais de 25% são graças aos esforços do Missionário da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, Carlos Wizard Martins.
Foi assim, que a família de Fernando Elias Zábala Sosa, chegou a Montenegro. O processo de interiorização dos venezuelanos através da Igreja ocorre por intermédio do Missionário Carlos Martins que, em Roraima, entra em contato com as lideranças locais das igrejas em todas as regiões do País.
Vitor Hugo Barreto, bispo da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias de Montenegro, é uma das lideranças que disponibilizou o seu tempo e força de vontade nesta ação. “Como ele [Carlos Martins] entrou em contato com a gente perguntando se teríamos condições de abrigar algumas famílias, nós nos disponibilizamos. O nosso trabalho aqui é alugar uma casa e informar para ele quantas pessoas dá para abrigar no local. Ele vai no cadastro dele e vê qual a família que dá para trazer”, explica Vitor Hugo.
As viagens são feitas em voos comerciais a custo zero desde o ano passado, graças a um acordo entre o voluntário Carlos Martins e as companhias aéreas Latam, Gol e Azul, que prevê o uso de assentos desocupados. A igreja ajuda os refugiados em torno de seis meses até um ano, até todos conseguirem um emprego e se tornarem autossuficientes.
Além da família que já está alocada na cidade, mais duas são esperadas para se fixarem. Segundo o bispo Vitor Hugo, os venezuelanos que estão para chegar precisam de ajuda da comunidade. “Para a família que está aqui já conseguimos quase tudo, mas para a próxima família a gente está agora quase fechando o aluguel de uma casa com dois quartos, e vamos precisar de móveis, utensílios domésticos e roupas de cama”, fala. A expectativa é que eles cheguem no final deste mês, e a outra família em setembro, mas tudo depende da disponibilidade dos voos.
“São coisas simples, mas extremamente necessárias. Esse amparo faz toda a diferença para eles e, para nós, às vezes, não é muito fazer uma doação de alguma coisa que se tem a mais”, diz o bispo.
“Demoramos, mas chegamos”
Apesar da dificuldade com a língua brasileira, Fernando Elias Zábala Sosa, de 55 anos, é comunicativo e chegou a Montenegro depois de vários dias de viagens cansativas. Natural de Caracas, ele veio acompanhado da mãe, Luisa Sosa de Malave, de 76 anos e seu padrasto, Jesus Rámon Malave, de 72 anos.
A família, que morava em La Victoria, no estado de Aragua, já está há três semanas em Montenegro. Fernando considera a cidade muito aconchegante. “Eu vim com a minha mãe e o meu padrasto, mas meu filho ainda está na Venezuela, trabalhando informalmente. Eu também tenho um neto pequeno, mas conheço só por foto”, conta.
O venezuelano conta que os últimos anos foram sofridos, mas que antes era muito feliz sendo motorista de ônibus. “Eu trabalhava todos os dias e vivia tranquilamente. Ganhava 40% do que fazia. Quando entrou o governo do Maduro a nossa moeda baixou e não conseguiu acompanhar o dólar”, explica.
Segundo ele, antes ganhavam 400 dólares, que equivalia a 1200 bolívares. Hoje, ganham seis dólares mensais, que vale 48 mil bolívares, o que no Brasil seria R$ 24,00 por mês. “Nós tínhamos uma ajuda do governo e da Igreja a cada três meses, mas mesmo assim não dava, sempre faltava comida. Chegávamos a ficar de dois até quatro dias sem comer”, lembra Fernando. Ele ainda conta que antes pesava 105 quilos, e que chegou na cidade com 73 quilos.
A segurança era algo que o preocupava. De acordo com ele, os crimes não tinham limites. “Tinham bandidos que esquartejavam as pessoas e gravavam, e depois mandavam o vídeo para a família, só para botar medo”, conta.
Fernando Sosa credita a sua vinda à Igreja, e diz que foi curioso como conseguiu chegar ao Brasil. Havia quatro anos que ele tentava vender os seus móveis e eletrodomésticos para sair da Venezuela, e nesse tempo, mesmo por bolívares, não conseguiu. “O interessante é que um dia eu estava na casa de uma irmã da igreja e passou um programa na TV falando sobre ir ao Brasil com a ajuda da Igreja, eu peguei o telefone, mandei os meus dados e me candidatei. No dia seguinte me aceitaram e eu consegui vender todos os móveis em dólares em apenas 15 dias”, diz ele.
Depois disso, a família ainda passou por dificuldades até conseguir chegar ao seu destino final. “Nós saímos de Caracas com o dinheiro que tínhamos, e revistaram 40 vezes o nosso ônibus, então chegamos na ONU, na fronteira, e o nosso passaporte foi carimbado”, fala Fernando. Já em Roraima, eles ficaram em uma casa de refúgio da Igreja durante dias para oficializar os seus documentos.
“Quando eu cheguei nessa casa, que tinha apenas três quartos, já havia 96 pessoas. Quando eu consegui a carta de trabalho e saímos de lá, já tinham 120 pessoas”, conta. De Boa Vista, foram para Manaus e lá eles já sabiam que iriam vir para Montenegro. “Em Manaus não conseguimos dormir direito, era um calor infernal e tinha muito mosquito, ficamos no aeroporto e depois fomos para Porto Velho em Rondônia”, diz o venezuelano.
A viagem estava prestes a acabar, mas eles ainda tiveram que passar por Belo Horizonte para então vir para Porto Alegre. “Montenegro é muito bonita, mas agora estou focado buscando trabalho. Preciso urgentemente. A igreja é um grande apoio, mas não podemos depender dela”, fala Fernando.
Quem desejar ajudar as famílias que estão chegando na cidade ou Fernando com um emprego, basta entrar em contato com a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias de Montenegro que fica localizada na rua Buarque de Macedo, 692.