Estudo do IBGE revela que a desigualdade diminuiu, porém, as mulheres ainda realizam jornada de trabalho em dobro
Na última quarta-feira, 18, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que, em 2017, 84,4% da população de 14 anos de idade ou mais tinha afazeres domésticos em casa ou em endereços de parentes, o que correspondia a 142,4 milhões de pessoas. Os dados integram o estudo Outras Formas de Trabalho do ano passado, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua).
O levantamento indica, porém, a existência de uma grande diferença nas taxas de afazeres domésticos entre homens e mulheres. Enquanto 91,7% das mulheres faziam essas atividades, a proporção era de 76,4% entre os homens no mesmo período – uma diferença de 15,3 pontos percentuais. O percentual caiu em relação a 2016, quando houve aumento da taxa de afazeres domésticos, mas com maior intensidade entre os homens, cujo crescimento foi de 4,5 pontos percentuais.
A maior taxa de afazeres domésticos no domicílio ou em domicílio de parente, por idade, ocorreu entre o grupo de 25 a 49 anos, onde o percentual atingiu 88,4%, seguido pelo grupo de 50 anos ou mais de idade, com 85,6%.
Verificou-se o mesmo comportamento quando os dados foram analisados por sexo. Em 2017, a taxa de tarefas domésticas entre as mulheres de 25 a 49 anos era de 95,4%. Já entre as de 50 anos ou mais, 90,8%, e, entre as jovens de 14 a 24 anos de idade, 85,2%. Para os homens, a taxa era 80,9% no grupo de 25 a 49 anos, de 79,3% para os de 50 anos ou mais, e 63,5% para quem tinha de 14 a 24 anos de idade.
Por região do país, a pesquisa mostra que no Sul foi registrado o maior percentual de pessoas com afazeres domésticos no domicílio ou em domicílio de parentes, na população em idade de trabalhar: 88,2% do total. O Nordeste anotou o menor percentual: 79,7%.
O agente de correios e músico Lucas da Silva Jantsch, 25, faz parte dessa estatística que cresce lentamente. Ele conta que cresceu em uma família tradicional, onde sempre havia uma funcionária que auxiliava nos serviços domésticos. Assim, não percebia essa desigualdade, o que mudou com o tempo.
“Eu sou filho único e depois que passei a morar sozinho, comecei a perceber essas questões que antes não conseguia enxergar. Mais tarde, optei por dividir a casa com uma amiga, que foi responsável pelo meu processo de desconstrução, pois, até ali, tinha a ideia de que tarefas domésticas eram coisas destinadas somente às mulheres”, diz o músico. “Hoje tenho consciência de que tudo isso é resultado de processos culturais e sociais que reproduzimos cotidianamente, o que não é algo natural”.
Embora o agente de Correios tenha somado esforços para minimizar essa desigualdade entre homens e mulheres no seu cotidiano e reconheça a importância desse passo, ainda hoje ele conta com o apoio de uma diarista semanalmente.
Recorte social para entender desigualdades
Conforme a pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2016 e 2017, houve aumento da taxa de afazeres domésticos em todos os grupos de idade, mas a alta foi mais intensa entre os jovens do sexo masculino de 14 a 24 anos, com crescimento de 6,7%, e de 25 a 49 anos (6,6%).
No que tange à cor ou raça, percebe-se que as taxas de tarefas domésticas eram menores entre as mulheres brancas, segmento onde 90,9% executavam esses afazeres. Já entre as mulheres pretas, o percentual era de 93,5% e de 92,3% entre as pardas.
Ainda analisando por cor e sexo, a pesquisa mostrou que os homens pardos apresentaram as menores taxas de tarefas domésticas: em 2017, 77,8% dos homens brancos, 77,7% dos pretos e 74,7% dos pardos. No entanto, os homens pardos exibiram a maior elevação desta taxa: 7% entre 2016 e 2017.
O estudante de Artes Visuais Rafael Almeida Batista, 22, comenta sobre a importância de fazer recortes sociais diante de assuntos tão delicados. “É preciso compreender o lugar de fala dessas pessoas, sempre com o cuidado de não recorrer aos estereótipos”, ressalta o estudante, que divide a casa com uma colega. “Aqui em casa, não delegamos o que cada um tem que fazer, simplesmente fazemos de acordo com a necessidade”.
Escolaridade no padrão de comportamento
No que se refere à escolaridade, a pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que a taxa de afazeres cresce conforme aumenta o nível de instrução. O estudo apurou que, em 2017, 81,6% daqueles que não tinham instrução ou tinham o ensino fundamental incompleto realizavam as tarefas domésticas, contra 89,1% daqueles com ensino superior completo. No período, o maior aumento de taxa de realização ocorreu entre as pessoas com superior completo (5,1%) e o menor, nos sem instrução ou com fundamental incompleto (3,3%).
O IBGE informou que a taxa de realização mensura apenas se a pessoa realizou ou não algum tarefa doméstica. “A intensidade em número de horas semanais dedicadas a tais tarefas deve ajudar a diferenciar ainda mais sua realização por homens e mulheres. Contudo, essas informações são investigadas em conjunto com os cuidados de pessoas, uma vez que tais atividades, em geral, são realizadas concomitantemente”, esclareceu o Instituto.
Se consideradas as pessoas em idade produtiva que cuidaram de pessoas, o percentual sobe para 86% em 2017, um crescimento de 4% em relação ao ano anterior. O maior percentual regional foi no Sul do país (89,3%) e o menor, no Nordeste (81,8%). O percentual também é maior entre as mulheres (92,6%) do que entre os homens (78,7%). A maior discrepância entre os sexos é no Nordeste (27,1%) e a menor, no Sul (11,8%).
Empatia e diálogo
Quando o assunto é desigualdade entre homens e mulheres, o agente de correios e músico Lucas da Silva Jantsch, 25, comenta que a empatia e o diálogo permanente são fundamentais no processo de desconstrução.
“Somos resultado de tudo que aprendemos. Muitas vezes, reproduzimos o que achamos ser correto, por isso, é preciso ter cuidado. Conversar, estar aberto ao debate e, principalmente, saber se colocar no lugar do outro é um passo importante para que possamos enxergar questões tão delicadas da nossa sociedade”, conclui Jantsch.