Luto. Este feriado, para muitos, é sinônimo de lágrimas. Cada um encara o sentimento de perda de uma forma diferente
Dor. Saudade. Tristeza. Lágrimas e um sentimento de vazio. Finados é uma data carregada de emoção para todos os que guardam no coração lembranças de alguém que – apesar de ainda estar presente em sentimento – já não se encontra entre os vivos. A forma como cada um sofre a morte e encara o luto é diferente e precisa ser respeitada.
O termo “luto” vem da palavra em latim “luctu” e significa um conjunto de reações a uma perda significativa, não necessariamente vinculada à morte. Trata-se de um processo de mudança. Pode ser de lar, emprego ou a descoberta. Coisas que trarão mudanças profundas na existência de alguém. O mais conhecido e mais duro, porém, é o luto pela morte.
A psicóloga Milena Bitencourt lembra que, quando refletimos sobre a morte, temos de pensar em finitude. Um ponto final sem volta, que nos soa como um grande mistério. “E isso é extremamente difícil ao ser humano. Tanto que estamos constantemente buscando formas de prolongar a vida, seja ela no plano físico ou espiritual”, destaca.
Desde a infância, as pessoas aprendem que falar sobre a morte é algo negativo, capaz, inclusive, de atrair coisas ruins e até a própria perda da vida. “Mas, na verdade, esta é uma das únicas verdades irrefutáveis da vida humana”, completa Milena Bitencourt. A maioria das pessoas associa a morte diretamente a sentimentos considerados negativos, como dor, tristeza, sofrimentos, angústia. E, assim sendo, busca afastar a dor, evitando falar sobre o tema.

Mas será que existe uma “forma correta de agir” diante de um enlutado? Muita gente se sente desconfortável nesta situação. Embora a maioria das pessoas acredite que precisa falar algo para confortar o enlutado, Milena afirma que isso nem sempre é verdade. “Muitas vezes, as pessoas acabam falando justamente o que a pessoa que perde um ente querido não quer ouvir. Frases do tipo ‘Deus quis assim’, ‘está descansando’, ‘era a hora dele’ ou ‘está em um lugar melhor’, não confortam em nada. Muito pelo contrário, acabam sendo frases inconvenientes, desnecessárias e desagradáveis”, destaca a psicóloga. Ela orienta que não é preciso dizer nada, pois esta é uma situação na vida das pessoas em que absolutamente nada que possa ser dito é capaz de trazer conforto. “O melhor, nestes casos, é se fazer presente para apoiar o enlutado, oferecer um abraço ou um ombro para que a pessoa possa chorar e expressar a sua dor”, completa a profissional.
Dizer para a pessoa não chorar também não ajuda em nada, e até prejudica, pois é necessário que o enlutado expresse a sua dor e o seu luto. Segundo a psicóloga, tentar conter as demonstrações de sofrimento da pessoa enlutada apenas vai prejudicá-la. Acontece bastante de o enlutado querer falar sobre a pessoa que faleceu, então a orientação é deixá-lo se expressar, sem tentar impedir a pessoa de falar por medo de que isso irá causar mais sofrimento. Expressar o luto é fundamental.
Mesmo que a pessoa tenha atitudes que podem ser consideradas extremas, como um choro convulsivo e desesperado, não tente conter o enlutado. Embora exista uma crença de que a pessoa está sendo forte quando não chora, ou chora de forma contida, na verdade não é saudável para a superação do luto que a pessoa se contenha. Ela deve se expressar, “colocar para fora” o sofrimento. É importante saber, também, que não se deve apressar o enlutado a “superar” a perda, pois não existe um tempo determinado para isso, e a única forma de “superar” o luto é vivenciando-o.
Os estágios do luto e quando é preciso buscar ajuda
O luto tem cinco estágios: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Na negação, há a incapacidade de aceitar o fato, a sensação de se estar vivendo um pesadelo do qual vai se despertar. Quando a realidade se impõe, emerge a raiva e um senso de injustiça, acompanhado da pergunta “Por quê?” e suas variações. Quando a negação e a raiva mostram-se inúteis, passa-se à barganha, que consiste na tentativa de acordo para que as coisas voltem ao que eram, com promessas, negociação com a emoção ou em busca de achar um culpado, tudo feito, na maioria dos casos, em segredo. Na depressão, as pessoas enlutadas começam a ter real percepção da perda, costumam se isolar, ter crises de choro, problemas para dormir e dificuldade para exercer suas funções diárias. Na aceitação, o indivíduo enfrenta a situação conscientemente, as emoções já não estão à flor da pele, o desespero e a desesperança diminuíram e o processo de cura emocional se inicia.
“Tendo início, meio e fim, mas não um tempo específico para este fim, sabemos que o primeiro ano após a perda é o mais difícil, pois serão sempre os ‘primeiros tudo’ sem o ente querido (primeiro aniversário, Natal, …). Mas não significa que o luto acabe ao final de um ano”, destaca Milena. Para que um luto tenha sido bem elaborado, é necessário que o enlutado consiga seguir com sua vida. Trabalho, convívio social, amizades, afazeres rotineiros entram em estado de normalidade, não sem a saudade e a falta, mas com a compreensão de que a vida continua.
Quando este processo demora muito a acontecer, a pessoa está passando pelo chamado “luto complicado”. Porém, existe também o luto patológico, que é o luto como doença realmente. Neste caso, a dor da perda torna-se tão devastadora que afeta significativamente a vida do enlutado. “O mais estranho é que normalmente o luto patológico surge exatamente quando a dor é contida ou negada, por crenças limitadoras que dizem que é necessário ser forte, que chorar é para os fracos. Por isso, é tão importante falar sobre a morte, sobre sentimentos e como conseguir esperar que o tempo atue como agente curador”, defende Milena. Quando o luto se complica, a ajuda de um profissional da Psicologia pode ajudar a entender o que está colaborando para a permanência deste sentimento.
O luto varia conforme o tipo de morte?
Sim. A violência ou a perda por morte repentina, além dos sentimentos usuais acerca da morte, suscitam o sentimento do inesperado. O impacto da notícia deixa o enlutado desnorteado, chocado, o que potencializa os sentimentos de negação, raiva, tristeza.
Não que a perda de um ente querido, em sofrimento por qualquer doença mais prolongada, seja menos dolorosa. Mas o saber que a finitude se aproxima suscita sentimentos diferentes, que são mais serenos de serem assimilados.