Pais defendem alterações nas sinalizações para evitar constrangimentos
Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm direito a vagas especiais em estacionamentos em qualquer lugar do Brasil. A lei considera os autistas como “pessoas com deficiência” para todos os efeitos legais, assegurando direitos como as vagas prioritárias que visam lhes facilitar o ir e vir. Porém, como a sinalização não é clara e o transtorno nem sempre é perceptível a quem é leigo, alguns pais de autistas passam por constrangimentos ao usarem o espaço reservado que é seu de direito.
“Um que me aconteceu foi quando eu fui a um mercado onde estava sinalizado no chão com o desenho de um cadeirante. Pra quem é leigo, interpreta que seria só para um cadeirante, mas é um símbolo de deficiência e eu, sabedor dessa situação, coloquei a plaquinha da minha filha no painel e estacionei”, narra Marcelo Claro, pai da pequena Isadora, de 9 anos de idade, que é autista. “Quando eu fui descer do veículo, um rapaz que tem deficiência física olhou para o carro com um olhar de repreensão; de como que nós estávamos estacionamos numa vaga de deficiente. Ele não foi arrogante em nenhum momento, mas aquele olhar me causou constrangimento”. O pai retirou o carro e buscou vaga em outro lugar.
Relatos como o de Marcelo levaram a Câmara de Vereadores de Montenegro a debater o assunto com o Poder Executivo. A iniciativa foi do vereador Felipe Kinn (MDB) com o intuito de assegurar que o direito seja respeitado no Município. “Nós não podemos trancar dentro de casa pais, mães e filhos com TEA simplesmente porque a sociedade não entende que naquele espaço de estacionamento, tão necessário para estas pessoas, pode ser usado por pais ou responsáveis de pessoas com autismo”, resumiu o parlamentar.
Na pauta do encontro com a direção do Departamento de Trânsito do Município, sugestões simples: a impressão do símbolo do autismo nos cartões que autorizam o uso da vaga preferencial; e o estudo de adequações nas sinalizações viárias para que – mesmo que mediante algum adesivo, já que elas seguem normativas federais – demonstrem que as vagas também pertencem às pessoas com autismo. Elas serão analisadas.
“É um ponto onde um mínimo detalhe pode ajudar a causar um baita de um bem-estar, tanto aos pais como à criança”, resume o tesoureiro da Associação Ser Autista, de Montenegro, João Maciel Donbrowski. Pessoas dentro do espectro, ainda que em intensidades diferentes, costumam apresentar déficit na comunicação e na interação social e padrões restritos de comportamento, como movimentos contínuos, interesses fixos e hipersensibilidade a estímulos sensoriais. É assim que, pai de um menino de cinco anos de idade com o transtorno, Donbrowski sabe bem da importância do estacionamento preferencial.
“Geralmente aos autistas, quando a gente se programa de fazer alguma coisa com eles, eles vão programados para aquilo”, explica. “E se tu foge daquele combinado, como quando não tem vaga e precisa dar uma, duas voltas na quadra, isso acaba gerando um grande nível de estresse para ela.” O foco do direito à vaga, com isso, é garantir o conforto e, assim, algo mais perto da igualdade no acesso a bens e serviços a esses indivíduos e seus responsáveis.
Acesso às filas preferenciais também é desafio
Não só estacionamento, as pessoas com TEA também têm direito a atendimento preferencial nos estabelecimentos; e o dilema com a sinalização também é enfrentado. Em Montenegro, uma lei municipal de 2018, de autoria do vereador Juarez Vieira da Silva (PTB), tornou obrigatório que bancos, mercados, lotéricas, lojas em geral, restaurantes e afins colocassem placas com a identificação dos autistas como detentores do direito ao acesso prioritário. O não cumprimento prevê até multa de 300 URM’s (hoje, R$ 1.253,64). Na prática, porém, muitos locais não cumprem a regra.
“Existe a lei, mas não tem fiscalização”, lamenta João, da Associação Ser Autista. A legislação visava assegurar que o atendimento ocorresse de forma mais rápida, mirando no conforto do autista e em evitar gerar situações de crise com a espera. João conta que, entre 2019 e 2020, ao lado de outros pais de crianças com TEA, fez uma sensibilização com mercados e supermercados para que adequassem a sinalização de suas filas prioritárias nos caixas. Foi como conseguiram, de um por um, fazer com que a lei valesse. “Só ainda não tivemos resultado no Comércio de forma geral”, acrescenta.
A identificação oficial da pessoa com o transtorno, nestes casos, pode ser feita pelo RG – que já aceita a informação em seu modelo mais atual – ou pela Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), que vem sendo emitida desde o ano passado. João, porém, diz que, na maioria dos casos, conta com o bom senso dos estabelecimentos para que seja reconhecido o direito do filho, que tem TEA.