O que leva à participação permanente dos jovens nos encontros que cultuam a fé?
Quando o assunto é Religião, muitos preferem nem opinar. Outros acreditam que não dá para se calar e defendem aquilo que acreditam ser verdade.
Nesta área, o que tem chamado a atenção é a crescente participação dos jovens, principalmente daqueles que têm entre 14 e 24 anos. São muitos os grupos nesta idade, bem como as denominações religiosas. Cada uma com a sua crença e as suas atividades.
Em Montenegro e na região, há milhares de jovens que dedicam boa parte do seu tempo à renovação da espiritualidade. Os líderes concordam que, para atrair a este público, é preciso exercitar uma linguagem diferente e única.
Aos 14 anos, a montenegrina Gabrieli Schneider integra o Ministério Cia de Dança Ramos, da Primeira Igreja Batista (PIB). A adolescente começou a participar do Alopra, turma da PIB com a gurizada de 12 e 18 anos – que se reúne todos os sábados – para estudar a Bíblia e se divertir, em 2013.
“No começo, eu só ia por diversão e até quando o pessoal começava a orar eu não entendia muito bem. Não compreendia o significado. Depois de um tempo, eu passei a me interessar mais pela palavra de Deus e a buscá-lo com maior frequência. Essa experiência é inexplicável”, conta.
Há pouco mais de dois anos, a jovem, que se diz tímida, não se conformou mais em apenas assistir aos cultos da platéia e passou a fazer parte do grupo de dança. “Eu sempre gostei de dançar, porém antes eu dançava com os amigos, na escola e em festas. Nunca pensei que teria coragem de subir em um palco e dançar na frente das pessoas. Porém, em um dos ensaios, senti muita vontade e pedi à Jéssica (Jéssica Padilha), que coordena o grupo, para participar”, relata.
Gabrieli não dança apenas para ela e para o público que a observa e se sente bem fazendo isso. “Quando estou me apresentando, me concentro e danço para Deus. Acredito que as apresentações levam o espírito de alegria e de amor que Deus quer passar. Ele nos usa como instrumentos”, completa.
Voz e violão até no ônibus
Em praticamente todas as religiões, os jovens exercitam seus talentos artísticos em momentos de louvor. Cleiton Marques tem 18 anos e frequenta a Paróquia São João Batista, em Brochier, tocando e cantando. “Eu participo indo às missas, atuo em um grupo de canto, faço parte do CLJ (Curso de Liderança Juvenil), toco violão. Atualmente, não estou muito presente, mas sempre que posso vou às missas e participo com os grupos”, comenta.
Na Paróquia, também há integrantes do grupo Cenáculo de Maria. Em fevereiro, ocorreu a 73ª edição do retiro que promovem, em Salvador do Sul.
Cleiton, que ainda não participou do Cenáculo, foi a Salvador para prestigiar seus amigos cenantes e, na volta para casa, não faltou música.
“Voltamos em um ônibus e cantamos praticamente o tempo inteiro. Mesmo com as freadas, a música não desafinou e todo mundo cantou com alegria”, comenta.
O incentivo para continuar frequentando a igreja veio de casa. “Participo desde pequeno, porque meus pais sempre foram muito religiosos e eu, desde criança, ia junto às missas. Fui batizado, fiz a primeira Eucaristia, fui crismado e depois continuei participativo na Igreja Católica. Foram os meus pais que me incentivaram a participar”, diz. Os motivos para continuar são fortes. “Só de saber que Deus está sempre te acompanhado, rezar, cantar… isso faz meu dia diferente. Faz eu ver tudo que está ao meu redor com um olhar diferente”, completa.
A jovem que organiza as atividades da Jemon
Todos os grupos precisam de alguém que determine as atividades e que pense como serão desenvolvidas. Na Jemon (Juventude Evangélica de Montenegro), não é diferente. Quem cuida disso é Jéssica Kussler dos Reis, 18 anos. No dia-a-dia, ela é vendedora em um armazém da família, mas também é a secretária da Jemon. “Participo há seis anos. No início, eu era mais quieta e não procurava me meter muito nestas decisões. Comecei a organizar os eventos há uns três anos e hoje já não me vejo fora da Jemon. Faz parte da minha vida. É a forma que eu me vejo ajudando ao próximo”, comenta.
Jéssica observa que, em consequência de tantas mortes precoces e decepções, mais jovens estão procurando seguir a sua fé e aproveita para convidar todos a conhecerem as atividades da Jemon que, segundo ela, são bem animadas. “O máximo de jovens que já reunimos foi 120, mas isso é muito raro. As pessoas estão vendo que a vida sem religião não é tão proveitosa e estão encontrando nos cultos uma felicidade duradoura. As nossas reuniões ocorrem todos os sábados, a partir das 13h, na Igreja Luterana (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil) e todos estão convidados para conhecer.
Também teremos o encontro sinodal, reunindo grupos de várias regiões, nos dias 21, 22 e 23 de abril, em Linha Nova. Quem for vai ver que nossos eventos não são tão cansativos e monótonos como se escuta falar por aí às vezes”, completa.
A dedicação e todo o esforço na organização dos eventos é resumida em uma palavra de apenas duas letras, mas que, para Jéssica, significa muito. “A motivação é a fé. Tentar mostrar que existe algo melhor. É amadurecimento no ensinamento”, finaliza.
“O jovem busca uma razão para viver”, diz pastor
De acordo com o pastor da Primeira Igreja Batista de Montenegro, Daniel Guedes, a adolescência é uma fase de muitos desafios, pois é quando a pessoa tem mais vontade de aprender coisas novas. Também é um período em que discussões podem acontecer com maior freqüência.
“O jovem busca uma razão pela qual viver. Todos estes protestos mundo afora, que a mídia mesmo repercute, mostram que eles querem lutar, defender o que acreditam. O jovem procura um sentido para a viver, uma projeção de vida e, muitas vezes, um grupo com pessoas de mesmos níveis de idade e objetivos, proporciona isso a ele”, reflete o religioso.
Com a participação frequente na igreja, muitas coisas podem melhorar na vida dos adolescentes. “A convivência melhora em todos os aspectos. É preciso mais paz, amor, alegria. Servir ao próximo de fato. Fazendo o próximo feliz, a pessoa se sentirá ainda mais feliz”, completa Guedes.
“O desafio de mantê-los é grande”
O pastor Cléber Fontineli Lima, que está à frente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) de Montenegro, afirma que nem sempre a quantidade de jovens participantes é grande, mas sempre tem aqueles que estudam, aprendem e se colocam à disposição para ajudar o próximo. “O nosso núcleo jovem é a Jemon. A participação ali é muito cíclica. Por vezes, há uma alta demanda de jovens interessados. Já em outros momentos, baixa, mas o grupo nunca se extingue, porque sempre há os que ficam”, diz.
Cléber destaca ainda a importância dos pais nesse momento. “O desafio de manter o jovem é muito grande. Tem que ter uma linguagem diferente para que ele se sinta bem em ficar. Para a permanência do jovem, é preciso o apoio da família também, pois o jovem se espelha em seus familiares. Se o pai bebe bastante e se mete em confusão, o seu filho tem grande chance de seguir pelo mesmo caminho, pois o pai é seu espelho de vida”, destaca.
O pastor ainda expõe a real importância da união destes jovens. “No grupo, eles começam a compreender como funciona a sua comunidade, a igreja e aprendem sobre os escritos bíblicos. Ali se reúnem pessoas com o mesmo propósito, esse é o diferencial. Eles sentem mais solidez no que acontece. Ir para festas ou bares proporciona felicidades momentâneas, mas frequentar a religião proporciona felicidade sólida e contínua”, completa.
“É difícil falar a língua deles”
Na avaliação do padre Asabido Pedro Ludwig, que atende a Paróquia São João Batista, em Brochier, as pessoas, principalmente os jovens, têm muito mais caminhos para seguir e, portanto, nem sempre escolhem a direção religiosa. “Anos atrás, eles não tinham muitas opções e acabavam indo para conhecer, influenciados pelos pais ou familiares, e, por muitas vezes, conheciam de fato o poder de Deus e permaneciam. Às vezes, os jovens abandonam, mas isso acontece porque ainda há dificuldade em falar uma linguagem em que ele se enquadre. O que a Igreja Católica está fazendo é a realização de retiros, para mostrar a estes jovens que a Igreja também está disposta a se adequar sem perder a sua crença e servidão a Deus. Essa também é uma maneira de mostrar-lhes a importância da convivência e a preocupação com próximo”, detalha.
O aprendizado é indispensável
Mesmo quem já possui um posto de maior relevância dentro da sua religião também reconhece que é preciso estar sempre disposto a aprender e a ajudar ao próximo. A Mãe Mary de Oyá, dirigente espiritual, afirma que a responsabilidade pelo que faz é levada muito a sério em sua vida. “Sou Yalorixá, sou do santo. Isso inclui se privar de momentos e passar por outros tantos. Conhecimento, postura, humildade e desprendimento, sem estas características não é possível chefiar uma casa de religião, seja ela de Umbanda ou Nação, pois sou responsável pelos Orixás e também pela vida dos seus filhos. A cada problema ou dúvida, é na casa do Pai de Santo que um filho ou consulente procura respostas”, declara.
Mary observa também que a vida proporciona ensinamentos às pessoas a todos os momentos. “Estamos vivendo em constante evolução espiritual e aprendizado. Acabamos aprendendo todos os dias, com os problemas das pessoas e filhos e temos que ajudá-los, conforme nossa crença. Por isso, vivo 24 horas a religião. A cada dia, surge uma nova situação que precisamos enfrentar e ter forças. Em geral, meus problemas são pequenos perante em relação aos daqueles que estão à minha frente”, reflete.
O estímulo da família
De acordo com o Baba Hendrix Silveira, professor, teólogo e babalorixá, a idade depende muito da frequência com que a pessoa participa da religião.
“Eu nasci dentro do Batuque. Sou a quinta geração de minha família materna – e da paterna se perde no tempo – que vivencia o Batuque. Quanto a frequênca dos jovens nos eventos, depende bastante da faixa etária. Crianças e pré-adolescentes têm participado bastante. Isto se deve ao fato de os pais perceberem que, se a religião é boa para eles, também será para seus filhos. Outro ponto que contribui para isso é que estamos colhendo os frutos da luta contra a afroteofobia – medo ou ódio às tradições de matriz africana (TMA), como o Batuque e o Candomblé – e hoje muitas pessoas têm sido iniciadas em uma TMA mais por amor que pela dor. Já com adolescentes é mais difícil. Muitos são iniciados, mas não são participantes ativos dos rituais. A maioria se afasta neste período para retornar após a idade adulta”, explica.
“Como as TMAs não postulam posições dogmáticas cerceativas, o trânsito é tranquilo, ainda que, em comparação com o passado, existam mais adolescentes hoje nas TMAs. A busca por conhecimento e compreensão das forças da natureza é um fator preponderante para isto”, completa Hendrix. Ele lembra ainda da importância da participação ativa do jovem na religião. “Assim ele adquirirá uma melhor introjeção dos valores civilizatórios que fazem parte da filosofia das TMAs. Valores como respeito aos mais velhos, a trasngeracionalidade do conhecimento, a ludicidade, o comunitarismo e a vida coletiva como um valor importantíssimo nas relações entre as pessoas, com as divindades e com a natureza”, define.