Titular da Vara Criminal, André Tesheiner recebe homenagem na Câmara hoje
O que acontece em Porto Alegre hoje, em alguns anos, irá acontecer aqui. A frase foi dita pelo juiz André Tesheiner, uma das pessoas com maior capacidade para avaliar a crescente violência que toma conta das cidades do Vale do Caí. Titular da Vara Criminal há oito anos e meio, o magistrado, de 43 anos, está deixando Montenegro nesta terça-feira para assumir uma função na Corregedoria, em Porto Alegre, de onde é natural.
Ao se despedir da cidade, que lhe concederá um título de Cidadão hoje, às 10h, na Câmara, Tesheiner faz uma avaliação lúcida do quadro da violência. Para ele, a situação se agravou pela maior presença na sociedade de drogas como o crack e o aumento das disputas pelos pontos de venda entre as facções, o que desencadeou brigas pelo poder dentro e fora das cadeias. “O crack não chegou faz tanto tempo assim, mas houve um aumento muito grande da criminalidade. A maconha e a cocaína eram mais suportáveis”, observa o magistrado.
Pessimista, o juiz não vê melhorias no curto e médio prazos, já que a violência só aumenta, sem construção de novos presídios, efetivos baixos na Brigada Militar e Polícia Civil. Para ele, não existe solução milagrosa, mas é preciso trabalhar para enfrentar esta questão. André recorda que, em Porto Alegre, tempos atrás, os delegados comentavam que a maior parte dos homicídios era relacionada com o tráfico, o que está sendo visto também no Vale do Caí.
“Temos facções que controlam o tráfico tentando se instalar. Ou o pessoal se submete às facções, ou é expulso, muitas vezes até morto. Não tenho dados objetivos para dizer que a culpa pela briga de facções é do presídio, mas o indicativo é que sim”, pontua Tessheiner. Ele entende o tráfico como um “pacote”, envolvendo outros delitos, como roubos, furtos, receptação, homicídio e ameaça.
André vai além, ao alertar que a sociedade não abriu os olhos para o problema grave e trata o usuário como um pobre coitado, um doente, quando ele é tão responsável quanto o traficante. “Assim, a situação vai ficar cada vez pior. Não vejo mudanças”, sentencia.
O juiz entende que a lei de combate ao tráfico deveria ser mais grave e rígida, mas ressalta que um dos problemas está na interpretação e que o “pessoal” não enxerga a gravidade do tráfico. Ele não concorda com o fato de que traficantes condenados, que não tenham antecedentes, peguem penas mínimas e sequer sejam conduzidos ao regime fechado, podendo ter a pena cumprida com serviços comunitários à sociedade.
Ainda que naquela época não estivesse antevendo uma situação que acabaria se tornando mais grave, foi o magistrado o responsável pela criação de uma Vara Criminal, há oito anos. Em 2012 e 2013, a Vara Criminal de Montenegro foi escolhida a melhor unidade jurisdicional do Estado.
Um homem discreto, que admira Montenegro
Discreto, André é casado com uma advogada, também de Porto Alegre, e tem dois filhos pequenos, mas prefere não citar os nomes e a idade deles por questões de segurança. Dizendo-se perfeitamente adaptado ao Vale do Caí, lembra que a família estava instalada em Montenegro, com os filhos estudando em colégios da cidade. Ele garante que sentirá falta do trabalho e da correria do dia a dia.
Tesheiner reforça que a ideia inicial era permanecer mais cinco anos, mas precisou aproveitar a oportunidade surgida para trabalhar em Porto Alegre. O magistrado lembra que gosta dos restaurantes, de passear na beira do Rio, de ter uma vida normal “de olho aberto”, mas nunca com a necessidade de andar com segurança particular.
Ainda que não considere um sonho em trabalhar em Porto Alegre, assume que tinha a meta de retornar à capital, mas nega que não tem aspirações de ser desembargador ou presidente “disso ou daquilo”. Na Corregedoria, pretende ajudar aos colegas, assim como fazia em Montenegro, para que outros consigam desempenhar o seu papel da melhor maneira.
O crack não chegou faz tanto tempo assim, mas houve um aumento muito grande da criminalidade. A maconha e a cocaína eram mais suportáveis.
André Luís de Aguiar Tessheiner
Juiz de Direito da Vara Criminal de Montenegro