Recuperação. Durante esse período, ocorreram estudos, reuniões e audiências públicas, mas ainda não houve uma solução definitiva
Alagamentos de ruas e estradas, pontes caídas, muitas casas danificadas e algumas até destruídas… Esse era o cenário de Montenegro após o temporal do dia 22 de abril de 2011, uma Sexta-feira Santa, que deixou prejuízo para ao menos mil famílias na área urbana e rural. O volume das chuvas chegou a impressionantes 180 milímetros em poucas horas, o dobro da previsão para o mês. Alguns dias depois, uma comissão constatou que o Gigante de Pedra também havia sofrido com a tempestade, e que o acesso ao local tornara-se extremamente perigoso.
Já se passaram sete anos, mas os problemas no acesso ao Morro São João ainda não foram superados. O local está interditado desde o dia 6 de maio de 2011. Inicialmente apenas técnicos para manutenção das antenas podiam subir, mas a pé. Atualmente, o acesso a veículos, inclusive de pequeno porte, continua proibido, mas as trilhas a pé são realizadas.
Um resgate do problema, iniciado em 2011, revela que foram muitas as reuniões e audiências públicas em torno da necessidade de recuperação do acesso. Na linha do tempo desses últimos sete anos, percebe-se que a mobilização maior ocorreu nos dois primeiros anos, mas o assunto parece “esfriar” nos anos seguintes. A criação de uma Área de Proteção Ambiental (APA) no conjunto de morros São João e dos Fagundes, também conhecido como Morro da Formiga, foi cogitada, mas não saiu do papel.
O presidente do Conselho Municipal do Meio Ambiente (Comdema), Rafael Altenhofen, esclarece que há duas situações distintas ao longo da estrada Cláudio Kranz, que dá acesso ao Morro São João. Uma delas é a falta de manutenção da pavimentação asfáltica e da canalização de drenagem de águas das chuvas em trechos da via. A outra, refere-se aos pontos em que sua base de sustentação foi removida por força dos deslizamentos ocorridos naquela tempestade de abril.
“Ocorre que, nesse caso em específico dos escorregamentos, são necessárias intervenções e estudos mais amplos visando, inclusive, afastar-se riscos a estruturas e equipamentos”, acrescenta Altenhofen. “Tais como, por exemplo, os reservatórios de água da Corsan, que ficam em áreas próximas e abaixo de onde cruza a estrada e que, eventualmente, podem ser afetadas caso ocorra novo escorregamento”, cita.
O conselheiro salienta que, com base em estudos prévios ocorridos após a tempestade, e dado aos riscos a vidas humanas, por sugestão do Ministério Público e do Comdema, foi deliberado o congelamento de licenças ambientais dentro do poligonal da futura APA. Essa medida foi estabelecida até a definição do Plano de Manejo dessa área de preservação, com base em estudos geológicos, ambientais, sociais e outros, afastando tais riscos.
Conforme Altenhofen, mais tarde o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente transformou essa deliberação na Resolução 02/2015. “Essa resolução ainda não foi homologada pelo Executivo, mas está vigente, por homologação tácita”, analisa o presidente do Comdema. Ele critica a Administração Municipal, dizendo que houve omissão a essa responsabilidade.
Saiba Mais
Conforme a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, a Área de Proteção Ambietal (APA) irá abranger essa região:
– ao norte, Estrada Livino Joaquim da Silva; a leste, rua Coronel Apolinário de Moraes; a oeste, Av. Ernesto Pop; ao sul, ruas T. Weibul e Cel. Alvaro de Moraes.
Conselheiro afirma que “há interesses ocultos” para barrar a criação da APA
“Referente à questão da Área de Proteção Ambiental (APA), claramente há interesses ocultos, ainda não explicitados pelo Executivo em não criá-la”, analisa o presidente do Comdema, Rafael Altenhofen. Para ele, não há justificativa técnica ou legal para que o Executivo não reenvie o projeto de Lei à Câmara, uma vez que já houve várias reuniões e audiências sobre o assunto ao longo desses sete anos.
Rafael afirma que o Comdema já esclareceu dúvidas, tanto em reunião com vereadores como proprietários de terras na região de abrangência da futura APA. E acrescenta que a contrariedade ao projeto era apenas falta de informação e de diálogo. “Ou pior, de boatos que eram espalhados com o intuito de desconstrução do entendimento”, acrescenta.
Outro obstáculo para a aprovação da APA seria o impacto gerado pela necessidade legal de autorização do Conselho Gestor da Unidade de Conservação, para licenciamentos ambientais situados dentro de um raio de 10 km do entorno, conforme previsto na Lei Estadual 11.520/2000. Ele diz que essa questão foi superado, pois o o Comdema, em diferentes oportunidades, mostrou que outros municípios já haviam encontrado alternativas. “Como Porto Alegre, por exemplo, que pré-licenciava atividades no entorno por meio das instruções normativas 02/2016 e 04/2016”, afirma.
Altenhofen faz referência ainda à Resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), 319/2016, estabelecendo que não é mais necessário solicitar autorização ao conselho gestor da unidade de conservação para licenciamento ambiental para a maioria dos empreendimentos. “É importante destacar que, por absurdo que pareça, em consulta a processo interno da APA, não constam alguns dos documentos emitidos pelo Comdema, justamente visando que fossem sanados tais ditos empecilhos”, salienta.
Ele finaliza dizendo que, após um diálogo possibilitado pela “elogiável postura técnica” do ex-secretário de Meio Ambiente, Rafael Almeida, que culminou com a construção de uma proposta que seria reapresentada ao chefe do Executivo, e submetida à Procuradoria Geral do Município (PGM) e à plenária do Comdema, houve a exoneração do então secretário um dia antes da data em que essa proposta seria fechada. “Desde então somente fomos procurados pelo novo secretário na manhã do dia 8 de maio (terça-feira), para se apresentar, mas não tivemos mais nenhuma evolução sobre a APA, que, reitero, trata-se de responsabilidade do gestor, e não de benesse, por tratar-se de risco a vidas humanas”, afirma.
Prefeitura não fala em prazos para a solução
O secretário municipal de Meio Ambiente, Adriano Campos Chagas, diz que a Prefeitura está investindo em educação ambiental, junto às escolas, de forma preventiva. Ele acrescenta o incentivo a subidas ao Morro São João com a comunidade, como ocorreu no último sábado, dentro da programação de 145 anos de Montenegro, e que serão planejados passeios ecológicos periódicos.
Chagas afirma que o acesso de veículos ao Morro somente deve ocorrer em casos extremos e com prévia autorização da secretaria. E não fala em prazos para obras de recuperação desse acesso.
Sobre a futura área de proteção, ele menciona a região de abrangência e lembra a resolução do Comdema 02/2015, que aguarda homologação, que suspende processos de licenciamento ambiental na região da futura APA. Chagas diz que a secretaria tem um plano de ação e pretende, em parceria com o Comdema, buscar recurso junto ao Fundo Municipal de Meio Ambiente (Fundema) para abrir a cotação de empresas para confeccionar o Plano de Manejo Florestal, mas também não menciona previsão de prazos. Esse documento é necessário para a definição dos assuntos sobre a APA.
Linha do tempo
2011
– Em abril, no dia 22, Sexta-feira Santa, um temporal atinge Montenegro e região, deixando um rastro de destruição. Após vistoria realizada 15 dias depois, por uma comitiva formada pelo então prefeito Percival de Oliveira, o então diretor municipal de Meio Ambiente, Adair José da Silva, o Dadá, e representantes da Patrulha Ambiental da Brigada Militar, o Morro São João foi interditado no dia 6 de maio. A vistoria constatou áreas bloqueadas com rochas e árvores, além de risco de novos desabamentos.
– O acesso interditado também a pedestres dificulta a manutenção das antenas instaladas no topo do Morro São João. Somente os técnicos poderiam subir, mas a pé. Várias reuniões são realizadas ao longo dos meses seguintes sobre o assunto.
– A empresa AnbiÉtica é contratada pela Prefeitura para fazer uma análise para definir as medidas a serem adotadas. Para a Prefeitura, esse estudo e a indicação de solução teve custo de R$ 14,5 mil.
– Em dezembro, a situação do Morro São João foi tema de audiência pública com a participação de técnicos da AmbiÉtica. Entre o que foi apurado, foram encontradas mais 40 trilhas formadas para uso de ciclistas ou motociclistas que podem ter contribuído com os deslizamentos ocorridos naquele ano. Além de a vegetação ser prejudicada, em dias de chuva, elas acabam levando a água para locais inadequados, aumentando o risco de desmoronamentos. Fora dito que a criação de um parque nacional, que consiga preservar os ecossistemas naturais, seria uma forma de uso sustentável do Morro.
2012
Em janeiro, o estudo realizado pela AmbiÉtica foi apresentado à comunidade. Foi constatado que o risco na utilização dos acessos a passeios ecológicos e às torres era pequeno, podendo ser liberado após a execução das obras de recuperação. Se houvesse essas obras, o trânsito a veículos de pequeno porte também poderia ser liberado. O relatório apontou outras medidas, como limpeza e construção de canaletas, caixas de redução de velocidade e projeto geotécnico de estabilização, contemplando estudo de alternativas técnicas, projeto executivo e execução.
– O Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) propôs a transformação daquele espaço, junto com o Morro da Formiga e as terras alagáveis do Rio Caí, em Área de Proteção Ambiental (APA). Ainda em janeiro, foi entregue um projeto ao então vice-prefeito Marcos Griebeler, para que o Morro São João seja decretado Unidade de Conservação, na categoria APA. A ideia também foi apresentada à comunidade em audiência pública.
– Paralelo às discussões e reuniões, o acesso continuava restrito. A subida ao Morro só era permitida mediante solicitação de autorização junto ao Corpo de Bombeiros e à Prefeitura. Mesmo assim, no dia 8 de agosto, uma empresa subiu no local para realizar a construção de uma antena. A estrada estava interditada com cargas de aterro e placas de advertência, que foram retiradas durante a subida irregular. Na ocasião, equipes da Secretaria do Meio Ambiente e da Patram subiram e notificaram os funcionários da empresa.
– Ao final daquele ano, a Prefeitura apresentou, à imprensa, o projeto de lei de criação da APA no conjunto de morros São João e dos Fagundes, também conhecido como Morro da Formiga. A proposta seguiu para apreciação do Legislativo e, após publicação, o Executivo teria prazo de 12 meses para apresentar um plano de manejo da área. A área está situada entre os bairros Centro e Timbaúva.
2013
– O projeto de lei para transformação do Morro São João e de seus arredores em uma APA foi encaminhado à Câmara no final de 2012, mas não chegou a ser votado naquele ano. Em janeiro de 2013, o então prefeito Paulo Azeredo pediu a devolução da matéria para novas análises.
2014
– Passados cerca de 18 meses da sua retirada, a Prefeitura encaminhou novo projeto de lei que criava a APA São João do Montenegro para a Câmara, em agosto. Contudo, diante de uma série de dúvidas manifestadas pelos vereadores na época, foi novamente retirada pelo Executivo para ajustes.
– O problema da falta de condições de acesso ao Morro São João continua e prejudica a manutenção das antenas, gerando queixas das empresas e usuários dos serviços de telefonia e internet, bem como quedas nas tramissões de rádio e televisão. A situação motivou uma reunião da ACI Montenegro e Pareci Novo e representantes das empresas que utilizam as antenas com a Prefeitura. Na ocasião, Carlos Eduardo Müller (atual prefeito) era titular da Smic, e disse que Prefeitura não tinha recursos para realizar a recuperação do acesso. Ele acrescentou que, após a realização de um projeto da obra, seria buscado auxílio junto ao governo federal.
2015
– Pela segunda vez, o então prefeito Paulo Azeredo retirou o projeto de lei sobre a criação da Unidade de Conservação – APA – da Câmara de Vereadores, alegando necessidade de fazer ajustes para não interferir, por exemplo, na prestação dos serviços de radiofusão e de internet, que dependem das antenas no topo do Morro São João. O texto estava em análise na Comissão Geral de Pareceres e já havia passado pelo crivo da consultoria jurídica, que apontou a necessidade de correções, caso contrário, a matéria seria rejeitada. Um dos pontos apontados era que o Código Estadual do Meio Ambiente estabelecia que, num raio de 10 quilômetros no entorno das unidades de conservação, além dos licenciamentos ambientais, os empreendimentos e atividades necessitariam de prévia autorização do órgão gestor da unidade.
– Em abril, a Prefeitura assina contrato para elaboração do projeto de recuperação do acesso ao Morro São João com a Projeinfra Engrenharia Ltda, vencedora da licitação. O projeto tem custo de pouco mais de R$ 46 mil.
2016
– Passado um ano que a empresa Projeinfra Engenharia entregou a última etapa do projeto de recuperação do acesso ao Morro São João para ser analisado pela Secretaria Municipal de Obras Públicas (Smop), o Município ainda não havia obtido dinheiro para executá-lo. Técnicos e engenheiros da Projeinfra vistoriaram o Morro e indicaram questões indispensáveis a serem construídas. Muito além de asfaltar a via, era preciso terraplanar, sentar base sólida, erguer muros de contenção das encostas e instalar sistema de drenagem para a grande quantidade de água das chuvas, além de vertente, que desce do Morro. O conjunto dessas obras exige um valor substancial que, naquele ano, fora dito que poderia ultrapassar os R$ 2 milhões, recursos indisponíveis ao município, que pretendia buscar aporte financeiro junto ao governo federal.
2017
– Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017, chegou a ser incluída verba de R$ 50 mil para pavimentação da Estrada Cláudio Kranz. Porém, não houve melhorias no local nem a criação da APA saiu do papel.