Autoestima pode ser prejudicada na era das redes sociais

As redes sociais têm cada vez mais objetivo de conectar e unir pessoas de diversos lugares do mundo, criando comunidades e enriquecendo a experiência de vida de cada um. Apesar dos seus benefícios, como manter as pessoas próximas pela tela de um smartphone, nem tudo que parece bom para você pode realmente ser. Ao abrir alguma rede social, hoje em dia, na maioria delas você encontra fotos e vídeos de pessoas bem sucedidas, bem vestidas, com o corpo dentro do padrão pré-estabelecido pela sociedade, alimentação completamente balanceada, em viagens grandiosas e quase sempre absolutamente felizes. E é aí que surge uma problemática. Você se sente menos capaz quando se depara com estes posts? E, afinal, será que tudo que parece é?

Psicóloga montenegrinha Danuzia da Silva. Foto: arquivo pessoal

Em 2019, a psicóloga montenegrina Danuzia Silva realizou uma pesquisa com jovens brasileiros sobre o uso das redes sociais e suas implicações psíquicas. Segundo ela, fatores como a autoestima e a distorção da realidade foram apontados como problemáticos, além da dependência, consumo excessivo e sentimento de vazio após o uso das redes. Para ela, quando se fala de autoestima, é necessário pensar em toda a construção, entender como foi o desenvolvimento emocional em cada fase e a maneira com que lidou com limites, frustrações, diferenças e alteridade. “Reconhecer isso influencia em como cada um irá lidar com os aspectos negativos das redes sociais, a intensidade e a frequência que poderá ou não afetar a autoestima de alguém”, destaca.

Vale lembrar que a autoestima envolve autoimagem, percepção, valoração, escolhas, pertencimento, autonomia e atendimento de demandas internas e externas em equilíbrio. É justamente por isso que Danuzia considera perigosa a pressão que as redes exercem sobre as pessoas, no sentido e na forma de discurso e representação da experiência de ser e viver. Ela ressalta a problemática dos “likes”, ou curtidas, nas publicações. “Se não for postado é como se não fosse vivido, se não postar não terá valor. A validação parece ocorrer somente através de likes, visualizações, compartilhamentos e etc”, diz. “Considero problemático e perigoso. As experiências parecem somente ser validas se materializadas em uma imagem que promova um suposto reconhecimento do outro. Se não tiver tantos likes, não está bom, não está bonito”, acrescenta.

Segundo ela, tal comportamento, cada vez mais comum, pode gerar ansiedade, frustração, insegurança e distorção de realidade, além de poder levar à dependência e consequências drásticas. “A pessoa pode entrar em grande sofrimento e sequer se dar conta. Obviamente isso não ocorre com todos, e aí entra a o processo de cada um e a fase que se está vivendo. Precisamos considerar a história de cada um, a pressão social, cultural, econômica e as transformações causadas pelas redes sociais na vida das pessoas”, salienta.

Padrões e soluções milagrosas
Somos atingidos o tempo inteiro pelos padrões já impostos pela sociedade e que estão enraizados na cultura do mundo todo. A psicóloga Danuzia aponta que juntando a insatisfação, autoestima fragilizada, padrões, a comparação de corpos e as soluções midiáticas milagrosas, há uma combinação que pode ser perigosa em um piscar de olhos. “Isso pode favorecer e levar a diferentes transtornos, pois influencia a autopercepção do sujeito frente às redes. Pesquisas vêm mostrando que o consumo de conteúdo de rede social em busca de seguir padrões estabelecidos por influenciadores levam as pessoas a submeterem-se a ações drásticas e também desenvolverem diversos transtornos alimentares, além dos outros mencionados anteriormente”, explica.

Isso ocorre porque a mídia vende a imagem dominante e soluções para chegar lá atingindo metas o tempo todo, mas será que este é o caminho? “Não sou contra as pessoas buscarem melhorias em suas vidas e que isso às vezes ocorre por meio de certa comparação. O que torna perigoso é a forma como irão percorrer esse caminho, ao que se submetem sem se questionar, sem reconhecer as necessidades e potencialidades internas e externas para alcançar o que se deseja sem a necessidade de se colocar em risco”, argumenta.

Não caia no jogo da comparação
É difícil, nos dias atuais, pessoas que não se comparem umas com as outras após utilizarem as redes sociais, pois elas fomentam e influenciam esta prática, o que também é uma problemática. Danuzia relembra que por meio da exposição, se tem mais acesso à vida do outro. “Mesmo sendo poucos fragmentos da realidade do outro, às vezes apenas um recorte escolhido e editado não deixa de ser um acesso à vida de outra pessoa. Essa imagem passada nas redes sociais pode envolver aparência, bens materiais, viagens, estudos e até mesmo desabafos acerca de situações difíceis. É a forma como alguém mostra o que fez, passou ou está pensando e expondo algo. A comparação torna-se inevitável”, opina.

Diante disso, quem olha muitas vezes pode nem se dar conta e, ao entrar em um jogo de comparação e competição, busca uma forma de ser aceito sem considerar sua vida real. “Nesse sentido, pode tornar a busca pela imagem perfeita, de acordo com a realidade de outra pessoa, uma constante. Isso não quer dizer que a pessoa não possa gostar, se identificar ou vir a querer fazer escolhas semelhantes, o detalhe é fazer só para ser aceito mediante a um imperativo”, explica a psicóloga.

Para minimizar essa problemática, é necessária atenção e conscientização sobre o tema, já que muitas vezes existe um abismo de diferenças entre as realidades. “É importante reconhecer sua realidade, ambiente, possibilidades e limitações, fazendo assim uma autoavaliação e autovalorização de suas experiências”, enfatiza. É necessário entender que as redes sociais são apenas um recorte, um fragmento, onde muitas vezes são vidas idealizadas que nos distanciam da realidade. Outra dica valiosa é a avaliação do tempo de uso das redes, pois isso pode afetar a forma como você se relaciona com o mundo real. “Estar perto e ao mesmo tempo longe das pessoas pode impactar nas relações. Você consome, mas acaba sendo consumido caso haja abusos. É necessário considerar a pressão social e as transformações causadas pelo uso de redes sociais na vida das pessoas”, alerta.

O principal problema que pode ser acarretado com o jogo das comparações é o esquecimento de viver a vida real. “Ao afastar-se da sua realidade, o indivíduo acaba deixando de viver experiências ao seu alcance, ficando alienado a pensar que somente a vida postada ou a vida alheia possam ser interessantes”, analisa Danuzia. Isso pode ocasionar sinais de impacto sobre si em torno de um não entendimento de uma exigência interna contra a externa.

Distorção da realidade em filtros
Outra coisa comum nas redes sociais é a utilização de inúmeros filtros, que dão, com toda facilidade, acesso à distorção de imagem. Para Danuzia, o uso de filtros pode ser divertido, mas, como toda ferramenta, pode ser igualmente perigosa. “À medida que a pessoa perde o senso crítico da ferramenta e passa a se valorizar somente usando o filtro, pode ser um grande problema”, destaca. Ela ressalta que a distorção pode ser prazerosa ao mesmo tempo que danosa, pois cria-se um espaço intermediário entre a realidade e a imaginação. “No mundo das redes sociais, os filtros propiciam uma melhora na performance, um inventar de si, sem se comprometer. Porém, as fantasias criadas a partir das imagens podem trazer riscos e decepções, uma vez que a identidade do que se encontra nas redes nem sempre é verdadeira implicando em desdobramentos confusos e até vicioso”, sublinha.

A influencer tem parceria com diversas empresas. Foto: divulgação

Coragem para ser de verdade
A montenegrina Rafaela Koetz, 23, se tornou influenciadora há cerca de 11 meses, trabalhando principalmente através do Instagram @rafaelakoetzz, onde acumula 11,6 mil seguidores. Ela aponta que o ramo não é fácil. Segundo ela, a maioria das marcas grandes procura homens e mulheres pertencentes a um padrão de beleza idealizado, o que faz com que muitas profissionais de sua área se sintam pressionadas. É a partir daí que entram os inúmeros procedimentos estéticos a fim justamente de chegar ao padrão imposto, o que pode ser perigoso. Por isso, afirma que ser uma pessoa “de verdade” nas redes, exige muito. “No momento que tu expõe a naturalidade e a realidade, sejam elas físicas ou materiais, exige muita coragem, porque hoje em dia, na internet, criamos um “personagem” onde as pessoas nos verão diante daquilo que a gente está mostrando, acreditando que somos só isso”, destaca.

Rafaela percebe que, nas redes sociais, as pessoas buscam uma realidade que é idealizada. “Elas querem ver uma expectativa de realidade que desejam, não uma vida real de fato”, explica. Ela conta que em seu trabalho, sempre buscou acima de tudo ser clara consigo mesma. “Isso sempre me fortaleceu diante às pressões sofridas neste meio. Acho que cada ser é único e isso deve ser aceito e respeitado”, ressalta. Apesar de ter ideias claras sobre seus objetivos e ter se jogado com tudo na nova experiência, Rafaela reconhece que a autoconfiança pode ser afetada. “No momento que tu te expõe, bota a cara a tapa na internet, tu está vulnerável a todos os tipos de julgamento. Isso faz com que eu tenha uma insegurança enorme, então, com certeza o que mais sofro diante a isso, é a falta de autoconfiança”, revela.

E é pensando sempre na autoconfiança e autoestima que a influencer busca estar em constante movimento, focando em seu autoconhecimento. Para quem está em busca de melhorar sua autoestima, ela dá dicas valiosas. “Conheça seus pontos fracos e fortes, compreenda seus limites e seja gentil consigo mesma. Não busque pela perfeição, porque ela pode te paralisar”, enfatiza. “Aprecie suas próprias conquistas, compare-se apenas consigo mesmo, tua visão da vida dos outros afeta a maneira com que você olha para si mesma. Quando possuímos expectativas realistas em nossas vidas, podemos parar de nos repreender e termos mais prazer em comemorar as pequenas vitórias”, conclui.

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