Caça às bruxas de humanas

“No creo em brujas, pero que lashay, lashay.”
Têm que existir! Não é possível que a história tenha nos pregado tantas peças, como, por exemplo, milhares de mulheres europeias acusadas de praticar bruxaria, ardendo em fogueiras por mais de 300 anos, a troco de nada! A Idade Moderna, das grandes navegações, do fim do domínio feudal e da ascensão da burguesia comercial, contribuiu para a disseminação de ideias fantasiosas e, assim, determinou o apogeu da caça às bruxas, queimadas após suas confissões espontâneas. Tortura era mero detalhe.
Por que não culpar as mulheres por todos os males que não podemos explicar? Afinal, foi assim desde o início. Desde o Éden.
Assim como as mulheres, livros também foram queimados ao longo da história da humanidade. Ou seria da desumanidade? Dentre as maiores queimas de livros estão a destruição da Biblioteca de Alexandria, a queima imposta pelos nazistas e o fim dos escritos budistas. É; parece que os livros também têm estranhos poderes.
Assim como as bruxas e os livros, as Ciências Humanas têm sofrido ataques sistemáticos. No Japão, há cerca de dois anos, o governo vem pedindo o cancelamento e cortando verbas de diversos cursos de Ciências Sociais e Humanas. Conforme o Primeiro Ministro japonês, “as pesquisas teóricas deveriam ser substituídas por uma educação mais prática e vocacional.” Por aqui qualquer semelhança não é mera coincidência…
Não quero com isso desfazer das Ciências Exatas ou menosprezar a tecnologia. Nunca; jamais. Todas as áreas de conhecimento são importantes, necessárias. Complementares. Mas, talvez, as humanas, a humanidade, seja justamente o que está fazendo falta àqueles que pretendem implantar a censura a ferro e fogo, revivendo “A Fogueira das Vaidades”, que foi outra queima grandiosa, não só de livros, mas de tudo aquilo que pudesse levar ao pecado. Obras de arte, por exemplo.
Realmente, livros são desnecessários aos militantes de internet. Esses mesmos que gastam seus dias, seus dedos, o pouco conhecimento que têm, usando o nome de pensadores e escritores dos quais nunca ouviram falar para justificar suas ideias insanas, dar bom dia e alguma lição da moral que não têm. A falsa moralidade também atende pelo nome de intolerância.
Perpetuar o conhecimento acadêmico está difícil, porque tem muita gente botando lenha na fogueira, brigando por valores que escondem preconceitos, tentando censurar quem pensa e tem a ousadia de se expressar. Audácia, dizem à boca pequena. Por muita gente que não viveu a ditadura, mas morre de saudades dela, só porque acha que a sua convicção deve se sobrepor às demais.
Ter uma opinião formada não deveria impedir ninguém de aceitar a liberdade de ideias, de criação e outras opções de vida. De admirar e respeitar o diferente.
Não é preciso magia para prever que os dias vindouros trarão, não apenas uma possível queima de livros, mas uma verdadeira caça às bruxas de Humanas. O caminho de quem briga pela liberdade de expressão, pelas artes e pelo conhecimento é bastante perigoso, mas, para mim, é uma batalha impossível de não lutar.
Precisamos estar preparados, pois, como disse Heinrich Heine, há mais de 200 anos: “Onde se queimam livros, acabam se queimando pessoas.” E disso eu não duvido.

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