Há mais de duas décadas sou pai. Há quase cinco, filho. Cheguei a experimentar, no década de 70, alguns dos conceitos mais arcaicos de paternidade, como o distanciamento, a severidade e cultura encaixotada de gênero. Meu falecido pai era bem mais velho que minha mãe, origem interiorana e um tanto inflexível ante às mudanças culturais que já colocavam um fim na autoridade incondicionada do homem, no patriarcalismo absoluto e na desigualdade que nascia no ambiente doméstico e se espraiava no círculos sociais, colocando o homem degraus acima da mulher. Não que isso tenha desaparecido por completo. Mas são outros tempos. O diálogo, afeto e independência que ofereço aos meus filhos era impensado naqueles dias. “Lamber a cria” era tarefa da mãe e “estragava a educação”. Os resultados estão aí. Hoje tentamos, em vão, bradar por um pouco mais de humanidade nas relações coletivas e individuais.
Cerca de 80% dos homens do planeta se tornam pais em algum momento da vida. Quase que a totalidade destes, entretanto, não assume a responsabilidade em proporção igual à da mulher com quem tiveram a criança. Por falta de vontade, nuns casos, mas também por falta de opção. Há ainda alguns impeditivos da cultura econômica, onde nenhum país do mundo (pasmem) tem uma relação de igualdade absoluta estabelecida entre homens e mulheres no que diz respeito aos cuidados com filhos, como licença paternidade e maternidade e etc. Estereótipos restritivos de gênero que, nalguns momentos, causam até conflitos de direitos que vão prejudicar o desenvolvimento dos filhos e criar novos ambientes de violência, como na questão da proteção à mulher em detrimento do direito de convivência de pai e filhos. Algo que não basta a letra fria da lei para equalizar.
O Brasil não tem muito o que comemorar neste dia dos pais. Quase seis milhões de brasileirinhos ainda não tem paternidade reconhecida. Outros tantos têm pais de selfie, pais sempre ocupados, pais que compensam distâncias com presentes. Muitas das diversas faces da violência que assola nosso pais nascem aí.Como a drogadição e o circuito de crimes que o universo das drogas nos impõe como uma inevitável avalanche. Um tripé de presença, afeto e exemplo, um não se bastando sem o outro, estimularia o melhor de nossa racionalidade desde cedo, incentivando o crescimento de cidadãos pacíficos, compreensivos, honestos e tolerantes. Ser pai não pode ser apenas o resultado imprevisto de uma farra sexual. Ser pai é projeto de vida, não acidente. É ser paz, não guerra. É ser interesse, não pressa. É ser, simples e amplamente ser. Há uma frase maravilhosa, do anarquista e revolucionário espanhol Buenaventura Durruti, que sempre extraio e colo em qualquer situação: “Precisamos criar um mundo novo, diferente do que estamos destruindo”. Sim. É por aí. Entendam como quiserem. Mas precisa ser pra ontem.