Sentados à beira da calçada, eu e meus amigos, com nossas pequenas bicicletas, observávamos aquele “chega e sai” de caminhões. Por um dos portões, entravam carregados de frutos. Do outro lado, saíam abarrotados de bagaços. A lógica era simples. O que ficava do lado de dentro daqueles portões, definitivamente, era o suco.
O tempo passou. Retornei, ao mesmo local, como concluinte do curso de Técnico em Química, para uma visita técnica. Frustração total. Um amontoado de tubulações. Uma máquina aqui, outra lá. Esteiras, engrenagens, um cheiro cítrico fortíssimo e só.
Rapidamente, outra decepção. Aquele lugar não fabricava suco. Se tratava de uma unidade de extração de óleo (essência), vendido para a indústria cosmética e farmacêutica por um valor incrivelmente alto.
Uma breve lembrança das tantas horas que passamos frente aquela fábrica, imaginando tanques e mais tanques de suco geladinho, foi o bastante para me advertir o quão frustrante se tornou conhecer o “outro lado” daquele lugar.
Nestas visitas, excetuando os “segredos industriais”, quase todas as perguntas são respondidas. Na minha ingenuidade, indaguei o quanto seria possível extrair de óleo de cada fruto. Ainda recordo meu constrangimento frente à reação do funcionário que nos acompanhava. Um silêncio interminável de dois ou três segundos. Um sorriso irônico. Outro silêncio e sua resposta. Eram necessárias várias toneladas para se obter algumas poucas gotas de essência.
Algumas dezenas de anos depois, já na Psicologia, algumas comparações entre estas lembranças e as tantas provas que a vida impõe são inevitáveis. Porém, duas são fundamentais. Vale para coisas, vale para pessoas: Uma é que você só conhece algo realmente quando o faz pelo “lado de dentro”. Outra, que para se extrair a verdadeira essência das coisas, muitas vezes, é necessária uma grande quantidade de matéria prima.
Jung dizia que ninguém se torna “iluminado” imaginando figuras de luz. Que o ato de “fazer consciência” é “um procedimento doloroso e desagradável”. Chegar à essência dá trabalho, exige tempo, investimento, esforço e conhecimento, mas é justamente nela que está seu maior valor. Logo, o resultado rápido, o alívio imediato, a fórmula da felicidade são o “suco geladinho” que alivia a sede instantânea, mas não dá conta das necessidades mais profundas da vida. Esta recompensa só atinge quem tem a paciência necessária para permitir-se ao árduo trabalho exigido pela alma.
Paz e Bem!