Os terraplanistas conquistaram seu espaço! Num mundo com tanto acesso e quantidade de informação, a confusão mental não poderia dar em outra coisa. Quando tudo está uma bagunça, nada melhor do que passar um trator com pá niveladora e deixar tudo planinho. Bonito! Compreensível e inquestionável.
Os terraplanistas estavam orgulhosos de sua luta, eram uma comunidade enorme espalhada pelo… pela chapa planetária. Reuniam-se periodicamente em eventos ruidosos que a cada ano agregavam mais participantes. A pauta daquele ano fatídico foi a ampliação do conceito planista a um patamar radical. O grande troféu dos teóricos era terem democratizado o horizonte. Agora todos tinham acesso à mesma linha reta que dividia o finito do infinito. Acabou também o preconceito dos de cima da linha do equador com os de baixo. Eliminaram a desigualdade vertical e precisavam ir além.
E o que mais causa desigualdade no mundo? O dinheiro! Para cérebros treinados em ver a grande conspiração geóide, era fácil ver que o conceito do dinheiro era mais um tentáculo do grande plano de dominação. O dinheiro era uma amarra social e só funcionava porque quem o recebia sabia que poderia passar adiante a outro incauto na troca de víveres. Se ninguém mais acreditasse no dinheiro, se ele não fosse mais aceito, o sistema iria colapsar. Saíram do simpósio determinados.
Queimaram cédulas, fizeram movimentos, demonizaram o dinheiro. O negócio começou a pegar “preço” quando o seu Zé do açougue aderiu. Exibiam nas redes pedaços de costelas mingas trocadas por 6 kg de batatas e 3 de tomates. Um ostentou duas belas picanhas que trocou pela velha CG 125 com escapamento furado.
Nesse mundo onde tudo era possível, a teoria prosperou e as discussões agora eram sobre os índices de valores de cada produto. Quantos kg de batatas valia um kg de carne? A batata doce teria acréscimo pelo açúcar embutido? Criadores de gado e de porcos não vendiam mais seu produtos, pois o custo de produção era alto. Produtores de hortaliças reclamavam do pouco valor dos vegetais. Os únicos que prosperavam eram os criadores de galinhas, pois elas comiam pouco, ficavam rapidamente prontas pro abate e, enquanto vivas, produziam ovos que podiam ser consumidos ou comercializados. A galinha era um ativo que pagava dividendos.
Não demorou muito para só existirem galinheiros no mundo plano. O problema agora era a quantidade de titica acumulada, já que não havia lavouras para adubar. Uns queriam abrir um buraco no planisfério e mandar pro espaço a bosta toda, mas cientistas alertavam que o espaço negro estava cheio de maus espíritos, que poderiam entrar na santa abóbada terrestre. Outros queriam construir uma enorme esteira até as bordas e congelar os excrementos. Seria a discussão do simpósio deste ano.
– Oi Olavo! Chegou cedo!
– É! Assuntos importantes, não dá para perder nada. Você sabia que está se formando um grupo de idiotas aí que não acredita nas galinhas?
– Que absurdo! Onde vai parar esse mundo plano?