Na lindíssima e triste canção “Love In The Afternoon”, interpretada pelo genial e inesquecível cantor e compositor Renato Russo, da Legião Urbana, música aliás composta pelo próprio e em parceria com o Eduardo Dutra Vila Lobos, também integrante da Legião, os versos impactantes da melodia assim iniciavam: “É tão estranho, os bons morrem jovens. Assim parece ser quando me lembro de você, que acabou indo embora, cedo demais.” Noutro trecho a letra diz: “_ vai com os anjos, vai em paz. Era assim todo dia de tarde, a descoberta da amizade. Até a próxima vez. É tão estranho, os bons morrem antes. Me lembro de você e de tanta gente que se foi cedo demais.”
Anteontem, dia 23 de maio de 2023, ao passar inadvertidamente pelo feed de postagens de um querido amigo e colega do TJRS, o Luciano, que é um cara bem mais jovem do que eu e extremamente talentoso também como músico, me deparei com uma publicação no qual ele, o Luciano, aparece na companhia de mais três outros, sendo que um destes era o Antônio, igualmente nosso colega do Poder Judiciário, advogado inteligentíssimo, um cara com o qual eu tive o enorme prazer de trabalhar, conviver, interagir e aprender.
Era, então, a manifestação dolorosa de um luto de amizade, a expressão do sentimento de perda e vazio que pulsava latente e inquietante no peito do amigo Luciano pela perda prematura do seu (nosso) amigo Antônio. Imediatamente mantive contato com o Luciano e fiquei sabendo que o Antônio voltara de uma partida de futebol, após o expediente no TJ e, ao chegar em casa, teria sofrido um ataque cardíaco fulminante.
Perplexo por tal notícia, não tive como deixar de relacionar esse tão triste fato com a letra de “Love In The Afternoon” e, no sofá da minha sala já tarde da noite me vi obrigado a ir até o congelador da geladeira, pegar algumas pedrinhas de gelo, passar a mão naquela garrafa do velho e bom companheiro das horas difíceis, injustas e intragáveis, o Sr. White Horse, e, lembrando dos melhores momentos da minha amizade com o Antônio, a ele brindei e chorei.
Chorei porque o Antônio era um ser humano que jamais poderia deixar de fazer parte desse plano. Um cara como ele, jovem com apenas 45 anos, inteligente acima da média, sério, competente, honesto, gentil, solidário, alegre, extremamente sensível e possuidor de uma empatia ímpar fará uma falta irreparável e deixará um vazio irrecuperável. Esse era o Antônio. Na verdade, ele era muito mais do que isso e eu fico imaginando quão dolorosa a dor sentida pela sua filha e seus demais familiares. Servidor concursado há cerca de duas décadas, já nos primeiros meses destacou-se, sendo rapidamente conduzido ao cargo de escrivão designado. Diferentemente do que ocorre com muitos outros, nunca permitiu que a ascensão a um cargo de chefia o afastasse da sua natural conduta de respeito e igualdade para com os seus colegas e subordinados. Ele usou a chefia para ainda mais se aproximar dos colegas e, com estes, estabelecer raízes para muito além dos muros do Judiciário.
Não há o que a gente consiga empregar para definir esse sentimento de perda e revolta. E é inevitável, inarredável a instantaneidade de questionamentos do tipo: Por que num mundo onde circulam tantas pessoas imprestáveis, más, injustas e cruéis, são os bons os que morrem antes?