Minha infância foi legal. Foi antes do celular e muito antes da Internet. Aliás, sou de uma geração que só foi ter televisão em casa aos 15 anos. E preta e branca, da marca Philips, com botão “soft” para trocar de canais. Meus avós, que tinham um pouco mais posses, possuíam uma Colorado RQ. Telefone, só fui ter aos 21 anos. Hoje crianças de 5 anos têm Smartfones de última geração.
Nosso divertimento era jogar bola no campinho em frente à casa do Ademar da Conceição, o Tio Duca, um dos filhos do Seu Olmiro, o Meu Tio. Não, ele não era meu parente, Meu Tio era seu apelido. Já contei certa vez quem foi Meu Tio. Patriarca da Família Conceição. Conhecido em toda cidade por pedalar a sua bicicleta pelos botecos com sua “capanga” atravessada nas costas e com seus bloquinhos de jogo de Bicho.
O campinho ficava ali, entre os trilhos e a rua Balduino Rambo no bairro Bela Vista. Fazíamos jogos duríssimos contra o pessoal da Vila Trevo. Nossa infância era jogar bola, brincar de esconde-esconde, subir o Morro e dançar nas reuniões dançantes aos finais de semana. Nada de Free-Fire ou videozinhos do Profeta Mirim. A infância era bem mais sociável.
Falando em bairro Bela Vista, algo que lembro daquela época era o perigo de passar de madrugada pela Bruno de Andrade, na Volta do Morro, quando íamos tirar ficha para o INAMPS. Nós, os adolescentes, cobrávamos uma “merreca” para ir de madrugada no Prédio do INSS, ficar na fila, para conseguir ficha de atendimento médico para os mais velhos. Eu e meus irmãos ganhamos algum dinheiro com essa atividade. Nada que nos deixasse ricos, mas, para crianças, era uma fortuna.
Antes de existir o INSS, o Instituto Nacional de Seguridade Social, que atualmente recebe as contribuições dos trabalhadores para garantir a aposentadoria de milhões de brasileiros, existiu o INAMPS, Instituto Nacional de Assistência Médica e da Previdência Social. Foi criado em 1977 e extinto em 1993. Atendia a quem precisasse de consulta médica. Foi um antecessor do SUS.
Para ir no INAMPS tirar ficha, nunca íamos sozinhos, mas em bando, porque, ao passar na Volta do Morro, corria-se o risco de ser atingido pelas pedras que vinham de cima. Havia muitas casas entre os trilhos e a estrada e o pessoal ficava escondido, jogando pedras em quem passava embaixo. Era de conhecimento de todos este risco e a maioria evitava passar de madrugada ali. Menos nós, os adolescentes da Vila Bela Vista, cuja única opção era ir de madrugada para ganhar uns trocos tirando ficha no INAMPS.
A volta do Morro voltou a ser notícia semana passada, devido aos assaltos que andam ocorrendo ali. Usuários de drogas ficam escondidos na mata e surpreendem quem passa caminhando ali para assaltar. Felizmente nossa cidade é bem servida de forças de segurança e a Brigada Militar, demandada, de pronto atendeu e reforçou o patrulhamento neste local.
Antes jogavam pedras, hoje assaltam para fumar pedra.
Corríamos risco de levar uma pedrada; hoje, de perder a vida por uma pedra de Crack. Nos tempos do INAMPS, era menos perigosa a volta do Morro.