Essa semana me peguei olhando a novela. Lembrei do tempo em que eu (e todo mundo), acompanhava as tramas das novelas com tamanha comoção e entusiasmo, que os compromissos familiares giravam em torno delas. Já vi festas familiares darem uma pausa porque era o último capítulo, ou a mocinha ia bater na vilã no horário nobre. Não havia muita crítica, ética, filtro ou qual dispositivo coerente. Mas então volta VALE TUDO.
E com as protagonistas mulheres negras. E os questionadores questionarão: Tu vai voltar a olhar novela? Sim e não. Mas…então… deixa eu te contar uma história! Eu fiz muitos gatilhos emocionais de uma vida toda. Como sabemos a maioria dos desfechos desta telenovela, não temos dúvida ou mesmo torcemos pela mocinha. Mas nos reportamos sobre a responsabilidade da Taís Araújo no papel.
O meu primeiro gatilho foi sobre ser guerreira, mesmo em situações que muitos não aguentariam. Em situações que chorar não era uma opção. Que, ao olhar para o lado, não via com quem contar. O segundo gatilho foi a cobrança em ser boa, ou seja em ser muito boa, em ser acima do esperado, a desbravadora daquele lugar.
Muitos sites, jornais e comentaristas, discutem sobre a necessidade de mesmo no mundo da arte, o quanto a comunidade negra precisa de um destaque excepcional para ser vista. O quanto, ao longo dos anos, não tivemos referências adequadas no mundo televisivo, o quanto pessoas negras com mesma atitudes de pessoas brancas são banidas da mídia sem dó. Por isso que me doeu um pouco saber que Bella Campos seria Maria de Fátima, uma vilã. Lembrando que não sou partidária da vitimização (Mimimi), mas que queria as mesmas oportunidades inclusive quando erramos. E foi pensando nessa afirmação, que voltei a mim.
A arte tem o dom da ressignificação. Por este motivo que queremos tanto o povo negro nos lugares a serem vistos. Para que possamos ter exemplos de atuação incríveis de nossas protagonistas. Para que o brilho da dramaturgia nos faça questionar a atualidade. Para que, justamente, possamos discutir de igual para igual, condutas, ações, ética, respeito entre outros temas. A novela promete, maior diversidade, de gênero, de raça, sexual e religiosa. Promete fazer um contraponto, com o formato dos anos 80 e a falta de representatividade, e com os muitos “rótulos vencidos”.
Bella deu uma entrevista significativa, referenciando todas as mulheres negras que vieram antes dela, na teledramaturgia, e construíram a base para esse momento. E quando voltei a mim, lembrei que foi por isso que lutamos: PARA ESTARMOS ONDE QUISERMOS. E como disse Cazuza: “Brasil mostre a cara …” Enfim, vou voltar a olhar a novela. Saravá!