Óbvio que sabíamos, quando decidimos largar tudo e viver essa loucura que é viajar de kombi, que experimentaríamos muitas coisas novas. Comidas novas, paisagens novas, temperaturas novas, desafios novos e tudo mais que já esperávamos. Porém, saímos há pouco mais de uma semana e já vivemos tantas experiências pela primeira vez que parece que nunca tínhamos saído de casa antes.
Já na sexta-feira, primeiro dia de viagem, tomamos banho, comemos e dormimos pela primeira vez em um posto de combustíveis. Pode parecer algo bobo, principalmente quando pensamos que milhares de caminhoneiros, por exemplo, fazem isso diariamente. Mas pra nós foi a assinatura oficial do contrato de viajantes.
“Busquem postos de combustível com muitos caminhões”, “caminhoneiro só para em postos bons”, “ se tem caminhão, tem banheiro bom e lugar seguro pra dormir”. Seguindo as dicas que todo mundo nos deu, buscamos nossa primeira parada: um posto na saída de Santa Maria (onde fomos buscar os passaportes), lotado de caminhões, com bons banheiros e um lugar tranquilo para passar a noite. E pra poder dormir, pela primeira vez precisamos abrir o sofá-cama com a Kombi toda equipada. Em poucas palavras: vai ser preciso paciência todas as noites e manhãs para “abrir caminho” e depois colocar tudo no seu lugar novamente.
Foi nesse dia também que, pela primeira vez, tivemos que dizer que não tínhamos endereço. Fomos em uma agência dos Correios enviar para Montenegro um documento que tinha vindo conosco por engano e, no remetente, colocamos nosso endereço antigo. Óbvio que nós e as duas atendentes caímos na risada quando dissemos que morávamos em uma Kombi e que nosso endereço, a partir daquele dia, era o mundo.
De Santa Maria, saímos com a ideia de chegar em Bagé algumas horas depois. Foram pouquíssimos quilômetros rodados e avistamos uma placa indicando São Gabriel, cidade onde um grande amigo nosso estava, visitando a família. Vamos? VAMOS! Nossa primeira mudança de rota. E nosso primeiro perrengue também. Quase 30 quilômetros de uma estrada de chão batido (de lama, na verdade). Tudo que tinha pra bater e cair dentro da Kombi bateu e caiu. Foi uma função daquelas! Mas sabe o que fez valer a pena? Descobrir paisagens lindíssimas dessa região do nosso estado. Pela primeira vez, no interior da Rota Pampa Gaúcho. Que encanto.
(Re)Descobrindo parte do Rio Grande do Sul
E daí, no meio de tantas descobertas, nos surpreende o resultado de uma pesquisa super-recente do Booking.com. Segundo o site, o brasileiro, dentre os povos da América, é o que menos se interessa em conhecer sua própria cultura. Conforme o levantamento, mais da metade dos viajantes (56%) afirmam que aprender mais sobre suas raízes é o maior diferencial de uma viagem pela região. O número sobe significativamente para 71% entre os colombianos e para 68% em meio aos mexicanos, mas cai para 43% entre brasileiros e argentinos.
Nós sempre fomos apaixonados pelo Rio Grande do Sul e não foi por acaso que demoramos mais do que precisávamos para seguir de Montenegro ao Chuí, fronteira que escolhemos para cruzar para o Uruguai. Vivemos a alegria de ver, de pertinho, biomas, paisagens, arquiteturas que só víamos em livros na escola ou ouvíamos alguém contar. Passamos um dia em Pelotas, conhecemos a Reserva Ecológica do Taim, a Lagoa Mirim, os campos e estradas sem fim de Santa Vitória do Palmar e o povo brasileiro-uruguaio do Chuí, o ponto mais ao sul do País.
Como não se encantar e se apaixonar pelo que é nosso? Como passar imune a tanta cultura, tanta beleza? Não sabemos. Saímos do território gaúcho com o chimarrão na mão, o Luiz Marenco no rádio e a certeza de que vamos, tendo um lugar incrível para voltar.