A Avenida Júlio Renner nasceu na década de 70, junto com uma série de reformulações pelas quais Montenegro passou à espera de uma grande mudança social e populacional que acabou não chegando. Essa história pode ser narrada em detalhes por Suzana Ferreira. Ela, que por mais de 30 anos trabalhou na Prefeitura, recorda de detalhes do chamado Projeto Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada (CURA) que operou mudanças decisivas na cidade.
Em 1978, o conselho de instalação do Pólo Petroquímico fez um estudo da “cidade nova”, que seria a zona da Timbaúva. Incluiria ações de assistência social, investimento em escolas e a chegada do Corpo de Bombeiros, além de toda a tubulação para esgoto da cidade e abertura de diversas vias daquela região. “Tudo para acolher a migração de pessoas que viria a Montenegro em função da nova fase do Pólo”, explica Suzana.
À época, toda essa região, hoje chamada de grande Timbaúva, era uma enorme chácara de propriedade do agropecuarista Erny Carlos Heller, que mais tarde seria prefeito. A ideia era urbanizar a região, para abrigar o aumento populacional que viria com as empresas que se instalariam em Montenegro. Só que esses empreendimentos não chegaram a vir por falta de incentivos, mas a nova estrutura ficou.
A Avenida Júlio Renner, a Via II, nasceu para ser a via expressa da cidade e não um ponto de parada. Porém, algumas empresas passaram a ali se instalar. Das atuais, a Poker é uma das mais antigas. Hoje a via é conhecida pelos inúmeros estabelecimentos comerciais e de serviço. Por lá não faltam mercados, postos de combustíveis e oficinas mecânicas, entre outros tantos estabelecimentos.
A Via II hoje é uma das principais ruas da cidade, abrigando, além dos estabelecimentos comerciais, importantes referências, como o Hospital Unimed, que recebe pacientes de todo o Vale do Caí; a Secretaria Municipal da Saúde e o Fórum de Montenegro.
Cada um que passa nessa Avenida de trânsito intenso durante todo o dia tem a sua visão da Via II. Para alguns, ela representa apenas o caminho para chegar ao Centro. A outros é a esperança semanal para tratar da saúde, seja de quem depende do Sistema Único de Saúde (SUS) ou conta com plano particular. Para quem está de carro, é uma via rápida. Aos que pedalam em meio aos veículos, é sinônimo de atenção constante e, aos pedestres que precisam chegar ao outro lado, resta exercitar a paciência.
Quem foi Júlio Renner?
Segundo informações do livro Traços Biográficos, de Elisa Moojen Arpini, datado de 1988, Júlio Renner foi um montenegrino nascido em 1º de junho de 1896. Com grande espírito realizador e capacidade de trabalho, foi um propulsor da economia local. Especializou-se na industrialização de carne, fazendo um curso de dois anos na Alemanha. Júlio Renner foi diretor-presidente do Frigorífico Renner. Também ocupou o mesmo cargo na Indústria Brasileira de Peixe, com sede em Rio Grande, e da Navegação Frigorrener Ltda. Além disso, o empresário, em 1936, deu início às obras de remodelação da primeira fábrica de banha, transformando-a num moderno frigorífico.
Júlio Renner faleceu em Montenegro, em 3 de agosto de 1961, aos 65 anos. Ele teve três filhos – Júlio Gaspar, Dora e Maria Luiza – frutos de sua união com Araci Leite.
Quem vê a Avenida Júlio Renner diariamente
Para quem apenas passa, a Via II pode parecer a mesma em cada dia, sem grandes alterações no decorrer dos meses, anos talvez. Mas para quem acompanha aquele fluxo contínuo de carros dia após dia não é bem assim.
Para Juan Carlo, 16 anos, a Avenida Júlio Renner é sinônimo de bons negócios. Todos os dias, ele comercializa frutas para quem passa por ali e vê seu caminhão estacionado. Morador da localidade de Vendinha, ali é seu ponto de negócios há anos. E se para quem apenas passa o movimento da rua é sempre o mesmo, Juan discorda. “Já teve verão bem mais movimentado. Esse tá tranquilo”, comenta. Não que isso seja ruim aos negócios. O bom de vender em uma rua tão acessada é que, mesmo os “dias tranquilos” representam uma multidão de possíveis clientes. “Já tem a freguesia, que vem aqui para comprar a melancia”, diz.
Há também moradores em meio a todos aqueles comércios. A família Souza está ali há mais de 40 anos. Viu muita coisa mudar, conforme conta o seu Elineu Alves de Souza, de 86 anos, enquanto toma um chimarrão com os filhos e, da calçada, vê os netos brincarem à sombra das árvores e os carros passarem tão rápido que dificilmente reconheceria algum conhecido.
“Estou aqui há muitos anos. Vi a rua mudar muito, mais carros passarem. Muita gente passa aqui. Não para”, comenta ele. Infelizmente, nem só coisas boas a família percebe. Maria Eloísa Souza, de 46 anos, não é mais moradora. Mas cresceu ali e hoje ainda frequenta bastante porque vai visitar o pai. Ela conta que a rua já foi mais bem cuidada, sobretudo na capina. “Os moradores cortam a grama da frente das suas casas, mas as áreas da Prefeitura ficam com o capim alto, o que deixa a Avenida feia”, diz Maria Eloísa.
Dali também observam os problemas no trânsito que, mesmo numa via larga, ocorrem. “Já vimos muitos acidentezinhos acontecerem. A velocidade é alta e, em alguns lugares, os motoristas precisam de mais atenção”, diz Mario Souza, de 57 anos, filho do seu Elineu. Um desses lugares é a frente da Secretaria da Saúde, que recebe muitas pessoas e onde, necessariamente, os veículos precisam trafegar em velocidade mais baixa. “Aquela obra que eles fizeram ali há uns três anos ajudou, mas não resolveu o problema”, finaliza Mario Souza.
Uma rua movimentada, que recebe todos os públicos
Por se tratar de uma via expressa, os carros costumam acelerar na Via II. Quem ali caminha todos os dias sabe que é preciso prestar atenção. Sobretudo porque, mesmo com os muitos quebra-molas e faixas de segurança, esperar que os motoristas ofereçam a preferência é contar com a sorte.
Maria Souza, de 62 anos, é moradora do bairro Cinco de Maio e caminha na Avenida Júlio Renner, indo e voltando do trabalho, diariamente. Para ela, a responsabilidade em se cuidar é do pedestre. “Sei que sou eu que tenho de me cuidar. Porque os carros estão passando e não vão parar”, lamenta Maria.
Anildo Rodrigues, de 63 anos, é um exemplo das muitas pessoas que, mesmo morando muito longe daquela região, vão seguidamente até a Via II. No caso dele, em busca dos serviços de saúde. Ele é morador de Capela de Santana e vem com a família até o hospital da Unimed, já que, em Capela, não estão disponíveis os serviços médicos de que precisam. A via, para ele, serve de estacionamento. “Aqui tem espaço para todo mundo”, comenta Anildo, que tem por costume aguardar os familiares no carro. Afinal,
não confia na segurança, mesmo que nada tenha ocorrido com seu veículo até então.
Há, ainda, a rotina de quem pouco vê a rua, mas sente os efeitos dela. Tom Martins, de 33 anos, trabalha em um salão de beleza situado na Via II. Ele passa o dia ali, mas pouco sai na rua. “Para o comércio, é bom o movimento. Mas, apesar do fluxo de carros, é uma via tranquila para quem está aqui”, comenta.
A bike, os carros e ônibus
Cléria Maria Schons, de 47 anos, esperava o ônibus em uma das várias paradas espalhadas por essa via, uma das principais artérias da cidade. Moradora do Cinco de Maio, ela vinha do Fórum e pretendia pegar uma das várias linhas de ônibus que ali passam para chegar em casa. Abrigada contra o sol, se disse satisfeita com o serviço. “Tem bastante ônibus passando. E as paradas estão bem cuidadas. Então isso aqui é muito bom”, comenta.
A mesma facilidade ela godstaria de ter para atravessar a avenida. É que, com certa dificuldade de caminhar, Dona Cléria precisa de paciência para esperar o fluxo de carros dar uma folga a fim dela conseguir chegar ao outro lado com segurança. “Tu pode fazer sinal que quer atravessar e eles nem te vêem de tão rápido que estão”, diz.
O mesmo cuidado é recomendado a quem usa a bicicleta e divide o espaço com os motoristas. É o caso de Renato Pereira de Souza, de 28 anos. “De bike, é complicado em qualquer rua da cidade. Tem que tá esperto pra não se envolver num acidente. Mas aqui é muito bom, pelo menos a gente tem segurança pra pedalar”, relata o morador do bairro Centenário, que aproveita as férias para curtir a cidade sobre duas rodas.
Um teste de paciência era feito por Bento Silveira, de 74 anos, pouco antes de ele conversar com a reportagem do Ibiá. Ele atravessava a rua na faixa de segurança próxima da Secretaria da Saúde. Ele, que consegue fazer a travessia rapidamente, sem maiores dificuldades, fica preocupado com aqueles que necessitam de mais tempo. “Aqui na frente da Assistência atravessam muitas pessoas doentes e mães com crianças de colo. Por isso deveria ter uma sinaleira aqui”, comenta Bento. Bento também cita a rótula feita há alguns anos naquele ponto da Via 2. Para ele, ela precisa ser repensada. “Os carros mal conseguem dar a volta”, reclama, citando que ela deveria ser bem mais aberta.